Combate ao trabalho infantil fica estagnado

Por Gisele Paulino

Ainda há cerca de 89 mil crianças entre 5 e 9 anos ocupadas no País

Apesar dos avanços socioeconômicos e da criação de políticas de combate à pobreza e ao trabalho infantil, a queda do número de crianças e adolescentes que trabalham no Brasil ficou estagnada nos últimos anos. O assunto incomoda dirigentes de órgãos de governo e organizações envolvidas com essa questão. Os mecanismos necessários para que os avanços experimentados nos primeiros anos de 2000 sejam restabelecidos deverá ser tema da 3ª Conferência Global sobre Trabalho Infantil, que será realizada no Brasil em outubro.

Mesmo com esse quadro mais lento de iniciativas, o Brasil tem motivos para comemorar. Entre 1992 e 2011, o número de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos que trabalham foi reduzido em 56%. O dado colocou o país numa posição de referência internacional no combate ao trabalho infantil. “O fato de a Conferência Global ser realizada no país já é uma evidência do reconhecimento internacional pelos esforços brasileiros nesta questão. É a primeira vez que o evento acontece fora da Europa”, afirma Laís Abramo, diretora do escritório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil.

Entretanto, existe a necessidade de o país aprimorar os esforços para chegar ao chamado núcleo duro do trabalho infantil que inclui o trabalho doméstico, o setor informal urbano e a agricultura familiar. “A questão é descobrir quais são os mecanismos que precisamos para chegar a estes locais onde mesmo a fiscalização do trabalho enfrenta dificuldade em alcançar. Essa não é apenas uma questão para o Brasil, mas para o mundo todo”, diz.

Na visão da diretora da OIT, é importante entender que é muito mais complexo e difícil eliminar os casos remanescentes de crianças que trabalham do que os iniciais. Em sua análise, o Brasil está perto de erradicar o trabalho infantil em algumas faixas etárias. Os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domícílio (Pnad) de 2011, do IBGE, mostram que há cerca de 89 mil crianças de 5 a 9 anos ocupadas no país – 0,6% das crianças nesta faixa etária. “Certamente, para uma questão de direitos humanos é inaceitável que exista uma única pessoa. Mas é um contingente que está no horizonte da erradicação”, afirma Laís.

Este perfil do trabalho infantil acompanha o desenvolvimento do país. Nas ultimas décadas, a criação do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), a intensificação da fiscalização do trabalho e o envolvimento do setor empresarial na questão, contribuíram para tirar as crianças dos setores formais da economia. Porém, na agricultura familiar ele ainda pode aparecer nas cadeias do couro, da carne, de aves, entre outras.

Anos atrás, era comum no Sul do país que as escolas dos municípios da zona rural suspendessem as aulas durante os períodos de colheita do tabaco por falta de alunos. Hoje, o setor é um dos que apresentam melhor desempenho no combate ao trabalho infantil, com campanhas junto aos 160 mil produtores. “Assumir que a atividade pode ter esse problema foi o primeiro passo para a mudança”, afirma Iro Schünke, presidente do Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco (Sinditabaco). As empresas associadas ao Sinditabaco cobram de seus produtores documento de matrícula e frequência escolar de seus filhos. O sindicato faz campanhas sobre o tema e usa programas de rádio e TV para levar informações sobre a proibição da presença infantil nas lavouras. “Não queremos estar em desacordo com a lei. Estamos no caminho certo.”

Desde 2005, o Peti compõe o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) e aposta em ações de transferência de renda para famílias com crianças ou adolescentes que trabalham, com serviços de convivência e fortalecimento de vínculos para crianças e adolescentes. Com previsão de repasse anual de cerca de R$ 250 milhões, o Peti atinge 853 mil crianças e chega a 3.588 municípios. Segundo o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), 1.913 municípios brasileiros concentram 78% do trabalho infantil. “Este grupo inclui as grandes metrópoles como São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e cidades com mais de 100 mil habitantes”, explica Telma Maranhão diretora do departamento de proteção social especial da Secretaria Nacional de Assistência Social.

A manutenção de políticas de geração de trabalho para adultos, a adoção da escola em tempo integral e a municipalização das políticas de governo são passos importantes para reverter o quadro. O MDS estuda meios de financiar os municípios que tratam essa questão como prioridade.