Comissão da Verdade apura crimes contra trabalhadores

Por Guilherme Serodio | Do Rio

A Comissão Nacional da Verdade (CNV) vai apurar violações de direitos contra o movimento sindical e trabalhadores durante a ditadura civil-militar. A iniciativa, levada pela Central Única dos Trabalhadores (CUT) à presidente Dilma Rousseff em fevereiro, foi acolhida pela comissão na última semana durante uma reunião da central sindical com a advogada Rosa Cardoso, integrante da CNV. O objetivo é criar um novo grupo de trabalho – o décimo terceiro desde o início das atividades da CNV em abril de 2012 – que seja dedicado à violência contra os trabalhadores e conte com a participação efetiva das centrais sindicais.

No dia 15 de abril, a proposta será levada às maiores entidades do setor em uma reunião no escritório da Presidência da República em São Paulo. O convite será feito nos próximos dias à Força Sindical, Central dos Trabalhadores do Brasil (CTB), União Geral dos Trabalhadores (UGT), entre outras.

A expectativa da comissão é que sindicatos e centrais possam contribuir para a investigação com documentos e depoimentos. “Há uma cultura oral muito forte no meio sindical e eles terão muitas questões a lembrar que não estão registradas”, disse Rosa Cardoso ao Valor.

Idealizadora da proposta, a CUT espera que a comissão ajude a esclarecer casos de assassinatos de sindicalistas. A central já entregou à CNV uma lista com mais de 100 nomes de trabalhadores mortos durante a ditadura, cujos assassinatos ainda não foram solucionados. “Queremos levantar todos os sindicatos que, no dia do golpe, foram fechados, sofreram intervenção, e também quantos líderes sindicais foram perseguidos, assassinados e quantos foram exilados”, disse Expedito Solaney, secretário de Políticas Sociais da CUT. “Há um consenso dos sindicatos sobre como os trabalhadores foram prejudicados com o golpe e agora é o momento de resgatar essa memória histórica”.

As linhas iniciais de investigação já estão traçadas e devem se concentrar nos casos de perseguição a dirigentes sindicais; intervenções promovidas pelo regime em sindicatos a partir do golpe de 1964; registro da destruição de patrimônio físico e documental dos sindicatos; e investigação de prisões, torturas e assassinatos de trabalhadores pelo regime ditatorial.

Categorias como rodoviários, ferroviários e trabalhadores portuários, alvos notórios da repressão, estarão no foco da investigação, assim como cidades onde ocorreram episódios de violência, como Santos e Niterói, onde trabalhadores foram presos em navios e no estádio Caio Martins.

“Os anos de chumbo não vieram só a partir de 1968 [quando foi instituído o Ato Institucional nº 5, AI-5], os anos de chumbo vieram, sobretudo para a classe trabalhadora, a partir de 1964”, disse Rosa. “Trabalhadores portuários ficaram presos em navios em Niterói sob condições infames, e há relatos muito fortes de tortura nesses navios”. A advogada irá presidir o grupo ainda sem estrutura definida, que pode abrigar representantes das centrais sindicais ao lado de pesquisadores.

Em evento em memória do golpe de 1964 no Sindicato dos Bancários do Rio de Janeiro na segunda-feira, Rosa afirmou que a CNV tem recebido pedidos de comissões estaduais da verdade para estender o prazo de seus trabalhos além de maio de 2014. O prolongamento permitiria a inclusão dessas investigações paralelas no relatório final da CNV. Rosa frisou que a possibilidade seria viável “apenas por alguns meses ao longo de 2014”, mas depende de decisão do governo.