Como prevenir casos de assédio sexual na empresa

Falta de preparo para agir diante de um episódio pode abrir flanco para processo trabalhista, além de prejudicar o clima na organização e reduzir a produtividade

São Paulo – Empresas com gestores sem preparo para agir diante de casos de assédio sexual ficam expostas a processos trabalhistas, além de provocar desânimo e baixa produtividade na vítima.

Também podem ter de lidar com a desarmonia no ambiente corporativo e com o risco de serem processadas até pelo funcionário assediador.

Uma pesquisa com profissionais brasileiros feita no ano passado pelo site Vagas.com revelou que 9,7% dos entrevistados já haviam sofrido assédio sexual no local de trabalho e, destes, 80% eram mulheres.

Para o advogado Marcus Gonçalves, sócio do escritório Bertolucci & Ramos Gonçalves Advogados, “passou da hora de as empresas entenderem que elas também têm um papel de influência na sociedade e devem contribuir para que não seja promovida a cultura de abuso contra mulheres”.

Dois erros comuns podem levar a grandes perdas financeiras das empresas na Justiça, alerta o especialista. O primeiro é a omissão. “A vítima que se sentir lesada porque não teve o apoio do empregador pode entrar com uma ação por danos morais contra a própria empresa, pois o artigo 932 do Código Civil deixa claro que o empregador responde por todas as ações do empregado”, explica Gonçalves.

Além disso, a Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), no artigo 483, prevê algumas hipóteses para a punição do empregador e, dentre elas, está a conduta que ofende a honra e a moral do empregado. “Essa é uma das cláusulas que permitem ao funcionário assediado pedir na Justiça uma reparação. O assédio em si é uma ofensa à honra”, afirma.

Segundo Gonçalves, a situação é ainda mais grave se o ato partir de pessoas em cargos de liderança. Isso decorre de uma mudança no código penal, no qual o assédio passou a ser caracterizado – quando ligado à estrutura de poder – como crime passível de até dois anos de detenção.

Mesmo em casos em que um diretor não tem conhecimento de que seu gerente faz isso, por exemplo, ele se arrisca a ser considerado, perante a Justiça, como conivente com a prática do crime. Por isso é importante agir assim que tiver conhecimento do problema.

O segundo erro tem a ver com a falta de provas para sustentar a demissão por justa causa do infrator.

O advogado explica que muitos empresários receiam demitir um funcionário por justa causa porque mais da metade desses desligamentos são revertidos na Justiça e podem implicar, além do pagamento de direitos trabalhistas que não tenham sido honrados no ato da demissão, o ressarcimento financeiro ao empregado por danos morais.

Para evitar essa situação, Gonçalves diz que é preciso fazer uma sindicância interna assim que identificado o caso. Ele esclarece que a sindicância interna é necessária para que a empresa tenha a liberdade de dispensar os assediadores por justa causa – e não para comprovar que é a vítima que está mentindo. “Precisamos acabar com essa cultura machista que, o tempo todo, tenta culpar as vítimas e inocentar os agressores”, diz.

A diretora executiva da Farisco RH, Amanda Farisco, concorda com a ressalva. “Quando o funcionário é demitido por justa causa, fica a lição para ele e para os outros. Quando isso não acontece, ele [o assediador] sai impune. Consegue arrumar outro trabalho facilmente e continua com a mesma atitude”, afirma.

O dossiê

Os especialistas orientam os gestores a sempre fazer uma acareação minuciosa, nunca expor funcionários – nem a vítima, nem o acusado -, reunir provas e tomar uma atitude.

Entre as provas podem estar uma filmagem (seja por câmeras de segurança que mostrem uma atitude suspeita ou até mesmo filmar o assediador ao confrontá-lo) ou gravação em áudio, depoimentos de testemunhas, cópias de e-mails, mensagens e tudo mais que for considerado relevante.

Amanda orienta ainda que, se a empresa decidir filmar ou gravar o depoimento do assediador, é preciso deixar isso claro para que depois ele não possa dizer que foi constrangido com uma gravação que não autorizou ou que ficou acuado em uma sala e pressionado. A especialista ainda orienta a registrar a sindicância em cartório. “Se a empresa tiver departamento jurídico, faça a sindicância com ajuda dos advogados, assinada e registrada em cartório, e inclua nela entrevistas com os envolvidos e testemunhas.”

Quanto à vítima do assédio sexual, fica o alerta para a empresa prestar todo o suporte necessário, destaca.

“Pessoas assediadas caem em rendimento, se desmotivam, ficam ansiosas quando sabem que terão de conversar e passar alguns momentos com o agressor. Num quadro mais agudo, podemos observar pessoas que desenvolvem depressão e pânico por conta de situações como esta. Se observarmos de perto fica nítido como a pessoa oprimida tenta criar alternativas para não precisar se dirigir ao seu agressor, pois a ansiedade que esta situação desencadeia é tão desconfortável que pode trazer sintomas físicos como dores de cabeça, dores de estômago, queda ou aumento de pressão arterial”, diz.

Se a situação estiver muito constrangedora, vale a opção de transferir a vítima para um setor em que se sinta melhor.

Para Gonçalves, empresas que implementam política contra o assédio e dão abertura para esse debate no ambiente corporativo ajudam a coibir que os acostumados com postura machista e assediadora tenham tal atitude. “Aí eles terão certeza de que sua conduta não será tolerada e ninguém fará vista grossa para suas atitudes”, observa o especialista.