Construtoras fazem de tudo para contratar

Valor Econômico
Por Carlos Giffoni | De São Paulo

Para atrair as pessoas para o processo de seleção, a Prime fez uma “feira”, cuja maior atração foi o sorteio de vários produtos

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O momento é de aquecimento para o setor da construção civil no Brasil. A grande demanda por obras públicas e de infraestrutura para os eventos esportivos que serão sediados no país apresentou ao setor o problema da escassez de mão de obra. Com prazos para serem cumpridos, empreiteiras espalhadas pelo país foram até o Acre recrutar haitianos, estão distribuindo prêmios em dinheiro e até fazendo sorteios para atrair trabalhadores.

Nos próximos dez dias, pelo menos 28 haitianos serão integrados às equipes de trabalho da construtora mineira Urb Topo. Eles chegaram ao país pela cidade de Brasileia, que tem sido a porta de entrada para centenas de haitianos no Brasil. Essa imigração despertou a preocupação do governo no início do ano, que anunciou a liberação de R$ 1,3 milhão para a assistência em saúde no Estado e a concessão de 1,2 mil vistos permanentes a cada ano para haitianos que queiram viver e trabalhar no Brasil.

Foi em Brasileia que o gerente de recursos humanos Frederico Moraes encontrou os seus mais novos 28 funcionários. “Saí de Contagem [na região metropolitana de Belo Horizonte] com todo o programa definido. A Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos do Acre ajudou a encontrar esses trabalhadores, que já estavam com a documentação regularizada. Até a retirada deles do Acre será paga pelo governo”, explica.

De acordo com o encarregado da construtora para recrutar os haitianos, apenas trabalhadores com experiência na construção civil foram contratados. E o salário é o mesmo de qualquer brasileiro: R$ 819 para trabalhar como ajudante de pedreiro. “A carteira será assinada, eles terão alimentação e moradia no local de trabalho e todos os direitos que os funcionários brasileiros têm”, diz Moraes. “A empresa estava com dificuldades para preencher vagas iniciais e os haitianos ficam contentes em receber o piso, que é muito mais do que receberiam em seu país.”

  

A taxa de desemprego em novembro na construção civil ficou em 2,7%, de acordo com a Pesquisa Mensal de Emprego, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O índice é bem inferior ao resultado geral do país para todos os setores, que ficou em 5,2% no mesmo mês.

Durante dois fins de semana de janeiro, a Prime Incorporações e Construções, que pertence ao grupo MRV, realizou feiras de emprego em Campo Grande e Cuiabá. Antes do evento, carros de som circularam pelas cidades divulgando o sorteio de eletrodomésticos, como bicicletas e televisores, que haveria no dia da “feira”, cujo real objetivo era encontrar e contratar cerca de 600 funcionários para os nove canteiros de obras que possui nessas cidades. “A ideia do sorteio era atrair o colaborador. Lojas de eletrodomésticos costumam fazer ações na porta para atrair o cliente. A gente também quis se diferenciar do concorrente e fazer com que esse trabalhador nos procurasse”, diz Alexandre Vilela, presidente da empresa.

O evento foi um sucesso. Mais de 1.300 se inscreveram para as vagas disponíveis e foi possível fazer uma triagem no próprio dia da feira. As pessoas saíam do local já com a carteira assinada.

A empresa fez uma parceria com as prefeituras de Campo Grande e Cuiabá, com os sindicatos locais e com bancos, que montaram postos de atendimento para que os trabalhadores que não tivessem conta bancária pudessem abrir a sua conta salário. “Até quem não tinha carteira assinada pode fazer uma na hora”, conta Vilela. Para isso, o investimento total foi de R$ 30 mil. “É pouco se dividirmos esse valor pelas 600 contratações feitas” – o que daria R$ 50 por funcionário admitido.

A empresa tinha motivos concretos para se preocupar com a disponibilidade de funcionários em suas obras, já que chegou a atrasar algumas entregas em 2011 e não quer correr o risco de ver os atrasos se repetirem neste ano, sendo que estão previstas as entregas de 9 mil apartamentos nessas duas capitais do Centro-Oeste a curto prazo. “Em 2010, muitas obras foram lançadas. 2011 foi o ano de execução dessas obras”, afirma Vilela.

A falta de mão de obra não se limita à especializada. Entre as contratações da Prime, 50% foram de serventes, que serão capacitados para ocupar outras posições nas obras. Os 50% restantes representam, principalmente, eletricistas e pedreiros, cujo salário médio é 31% maior que o de serventes.

Na também mineira Construtora Caparaó, a equipe de recursos humanos teve a ideia de dar prêmios, em dinheiro, para os funcionários que indicassem profissionais para vagas em aberto. Quando o indicado passa no período de experiência de 90 dias, tanto quem indicou como o recém-contratado recebem R$ 100 de bonificação.

“Se há vaga disponível, a gente divulga em todas as obras e incentiva a repercussão da vaga entre os funcionários”, explica Silvano Aragão, gerente de RH da empresa. Segundo ele, mais de 20 funcionários foram beneficiados com o prêmio em dinheiro desde setembro do ano passado, quando a prática passou a ser adotada – considerando os três meses de experiência exigidos para que o bônus seja concedido, esses prêmios foram entregues de dezembro para cá.

Jorge da Silva foi um dos beneficiados pela escassez de mão de obra na construção civil. Seu último emprego havia sido como técnico de laboratório em uma universidade em Campo Grande, de onde ele saiu em junho. Em janeiro, quando deixou de receber o seguro-desemprego, Silva viu uma oportunidade no anúncio da Prime. Contratado como pedreiro, seu salário, de R$ 1.200, é 50% maior do que o pago pela universidade. “Quando fui participar da seleção na Prime, já tinha sido aprovado em outras duas construtoras. Eu pude escolher”, diz.

As diferentes maneiras de atração têm sido criadas pelas empresas que precisam recrutar mão de obra na construção civil para atingir trabalhadores como Silva, que, diante da grande oferta de vagas e da escassez de mão de obra, podem negociar e escolher entre diferentes propostas de emprego.

Essa realidade ainda não é compartilhada pela Odebrecht nas obras do estádio do Corinthians, na zona leste da capital paulista. A empresa fez uma parceria com a prefeitura para recrutar mão de obra qualificada por meio do Centro de Apoio ao Trabalhador (CAT). “As funções são similares em praticamente todas as obras da construção civil pesada. A gente exige comprovação de experiência em carteira, devido ao grau de segurança necessário”, segundo Domingos Sávio de Araújo, gerente-administrativo dessa obra.

Os 1.038 funcionários que trabalham na obra vieram de três principais fontes. A maior parte conseguiu o emprego após indicação pelo CAT. O programa de capacitação profissional “Acreditar” também forma mão de obra capacitada. A empresa ainda pratica o reaproveitamento de outras obras que vão sendo finalizadas no período de construção do estádio. “A gente busca mapear obras vizinhas que estejam em fase de finalização para aproveitar esses funcionários, que já conhecem a dinâmica da empresa”, diz o gerente.