Beneficiárias do Bolsa Família conseguiram triplicar a poupança para enfrentar crises e emergências após projeto de educação financeira desenvolvido pela AEF-Brasil (Associação de Educação Financeira do Brasil), mostra pesquisa obtida pela Folha.
Segundo levantamento, feito com mulheres que passaram por cursos que ensinavam a gerenciar as finanças, o valor médio poupado aumentou de R$ 12,40 antes das aulas para R$ 37,10.
O projeto foi desenvolvido ao longo do ano passado pela AEF-Brasil com cerca de 3.700 pessoas de 15 municípios. O foco estava no que a associação qualifica como “adultos em condições de vulnerabilidade econômica”.
Muitas começaram a formar uma poupança por incentivo dos professores. Antes do projeto, só 23% tinham dinheiro guardado para eventualidades. O percentual passou para 38% após as aulas. Elas passaram também a planejar mais o uso dos recursos, mostram os resultados.
Antes, o índice de beneficiárias que pensavam no que fazer com o dinheiro era de 5,8, em uma escala que vai até 10 -agora foi para 6,3.
Outro público focado pela AEF foram aposentados de baixa renda. O número dos que se autodeclaravam inadimplentes caiu de 21% para 9% após o projeto. Antes das aulas, 77% diziam estar pagando dívidas -percentual que subiu para 91% depois.
Mesmo sem dívidas, a aposentada Edi Luisa Rezende, 61, conseguiu mudar hábitos com a ajuda das aulas. “Eu achava que, para guardar dinheiro, era preciso juntar muito. Mas, se você esperar chegar um valor alto, não chega nunca. Agora guardo tudo aquilo que posso”, diz.
O dinheiro está sendo aplicado na poupança do bisneto. “Aprender a economizar não vem de berço, a gente aprende com a vida”, complementa a aposentada.
Antes de definir como seriam as aulas, a AEF mapeou os temas que poderiam afetar mais os dois públicos.MAPEAMENTO
“Foi um projeto feito com eles. Fomos morar com alunos, entendemos o hábito de consumo e o núcleo familiar antes de desenhar as aulas”, afirma Claudia Forte, superintendente da AEF-Brasil.
“Você tem um número alarmante de aposentados em condição de superendividamento. Boa parte sofre pressão familiar severa, muitos são o principal provedor da família”, ressalta Forte.
Esse mapeamento ajudou a identificar despesas que fazem parte da realidade dessas pessoas, mas que eram desconhecidas pelos pesquisadores.
“Uma das mulheres, durante essa sondagem, levantou e falou que faltava algo, o pagamento do dízimo. Se entraram R$ 10, muitas tiram R$ 1”, conta Forte. “É um compromisso moral delas.”
Cada um dos dois grupos recebeu uma atenção diferente. Com as mulheres, o objetivo foi o de aumentar a autonomia financeira. “Elas não conseguem planejar, sonhar com o futuro, acham que não têm que cuidar do crédito. A gente viu mulheres com mais de 15 cartões de crédito”, diz.
Agora em janeiro, cerca de 300 mil mulheres vão receber material para melhorar a forma como lidam com o benefício social, que inclui uma agenda para anotar os gastos e envelopes para guardar os recibos das operações.
Mas essa mudança de hábitos passa por aprender a gastar com consciência, segundo o planejador financeiro Carlos Castro, da Planejar.
“Com o tempo a gente vai conseguir impactar a tomada de decisão sobre consumo, levar informação com curadoria para que esse consumidor possa fazer escolhas no dia a dia”, afirma o planejador. “Há uma luz no fim do túnel para que a gente consiga por meio da educação financeira mudar a consciência.”