Dirigentes fazem alerta em relação à competitividade

Comércio exterior: Aumento no volume de compras de importados divide opiniões na indústria

Cezar Faccioli | Para o Valor, do Rio

01/06/2011

Historicamente, as importações suprem de 4% a 6% da demanda interna de aço no Brasil. Em 2010, essa fatia superou os 20%, com as compras externas mais de uma vez e meia (154,2%) maiores que no ano anterior. Por mais que se dividam quanto à possibilidade de que o quadro se repita este ano, dirigentes de associações empresariais alertam para os problemas de competitividade que esse dado revela.

José Velloso, vice-presidente da Associação Brasileiras das Indústrias de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), aposta em novo crescimento da fatia estrangeira nos produtos siderúrgicos, em especial pelo efeito indireto da compra de maquinário pesado. “O setor de máquinas e os aços planos são os mais afetados, tanto em chapas finas quanto em chapas grossas. Mas também importamos aços especiais de alta liga”, explica. Ele adverte que não é apenas a siderurgia que sofre com essa realidade, mas todo o setor de transformação.

“Não são as indústrias nacionais que não têm competitividade é o Brasil que não é competitivo. Qualquer empresa atuando no Brasil produzindo bens de valor agregado sofre com a falta de competitividade frente ao produto importado, seja da Europa ou do Oriente”, argumenta. “Há seis anos, nossa empresa importa aços alta liga em barra da Alemanha. Este material chega ao Brasil a 60% do preço do aço nacional”.

Marco Polo de Mello Lopes, presidente-executivo do Instituto Aço Brasil (IABr), identifica uma desaceleração nas importações no início deste ano, mas faz coro a Velloso quanto ao risco de comprometimento da indústria a médio prazo. “O fenômeno é muito perigoso para toda a cadeia. Se somar a importação direta mais a indireta, você vai chegar a dez milhões de toneladas em 2010, ou duas usinas siderúrgicas. Há uma desindustrialização em curso? Com essas assimetrias, a situação ficará cada vez mais complicada”, afirma.

Velloso cita o próprio setor siderúrgico. “A CSA foi construída com a quase totalidade das máquinas siderúrgicas importadas. A Açominas também investiu recentemente na importação de seus equipamentos. A substituição do nacional pelo importado é realidade em vários setores. Esta é a regra. Nossas autoridades sabem do mal que nos assola e nada fazem. A destruição de tecidos industriais no Brasil é encarado como efeito colateral de um bem maior, infelizmente”, diz.

A articulação da cadeia produtiva para reagir a isso é precária, de acordo com Velloso. A Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), diante dos primeiros sinais de um boom nas importações de aços planos, anunciou a disposição de procurar clientes e fornecedores para iniciativas conjuntas.

Velloso comenta, entretanto, que a Abimaq não foi procurada. “A CSN não entrou em contato conosco. Somente a Usiminas. Desde meados de 2010 temos um trabalho em conjunto objetivando a melhora do aproveitamento do aço plano por nossos associados. A siderúrgica mineira aumentou a cota mínima para o acesso aos seus estoques pelos nossos associados,” informa.

Marco Polo de Mello Lopes, por sua vez, evita colocar-se abertamente contra as importações. “Somos contrários a condições artificiais. Em 2010, foram importados seis milhões de toneladas de aço, cerca de 20% do mercado. O consumo aparente cresceu no Brasil, mas foi atendido pela oferta externa”, lamenta.

O primeiro fator que favorece o artificialismo é a questão cambial. “Ao real valorizado você deve adicionar um outro dado: a desvalorização do yuan. Cerca de 26% das importações vieram da China. Com esses dois fatores, tem-se um efeito perverso, de até 70% de benefício no importado,” calcula.

A segunda questão que beneficia artificialmente as importações é a guerra fiscal entre os Estados. Sob pretexto de atrair investimentos em siderurgia, atrai-se a importação, com redução de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), ainda segundo Marco Polo.

São 13 Estados com esses benefícios, adotando essa política à revelia de decisão do Confaz, que reúne os secretários de Fazenda de todos os Estados e é o órgão que teria poder de decisão, mas nada decidiu sobre isso.

“Já foram impetradas 13 Ações Diretas de Inconstitucionalidade (Adins) sobre a medida. Foram impetradas pela CNI e pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos“, argumenta Marco Polo.

Os artificialismos internos, mais a existência de um excedente de capacidade de 530 milhões a 540 milhões de toneladas de aço no mundo, à procura de mercado importador, criou uma situação muito perigosa para o aço brasileiro. “Uma chapa de aço fabricada na China conta com uma vantagem cambial relevante. Soma-se a isso um benefício fiscal e um regime de importação da indústria naval, que pode reduzir ainda mais o custo, logo se vê que não há como competir”, conclui. Os dados sobre a origem das importações indicam que, entre 2009 e 2010, a fatia da China passou de 18,6% para 30,3%. Houve um aumento da Rússia (de 3,8% para 10,3%). Todos os outros países tiveram decréscimo.

Dados do Instituto Nacional dos Distribuidores de Aço (Inda) corroboram a tese de uma desaceleração em curso. Declarações de dirigentes dessas empresas reforçam a análise de que as especulações sobre novos aumentos perderam força. Em agosto de 2010, os estoques de aço nos distribuidores equivaliam a quatro meses de abastecimento. Quase o dobro dos 2,1 meses de março do ano passado, um mês antes da vigência da política de reajuste trimestral dos preços do minério de ferro. No início deste ano, o nível de estoques atingiu 3,1 meses.