Edna Simão e Lucas Marchesini | De Brasília
Os Estados e municípios tentam convencer o governo a criar uma loteria, desonerar tributos e apertar as regras para liberação de pensão por morte no serviço público para aumentar as receitas dos regimes próprios de previdência e, com isso, garantir o pagamento das aposentadorias no longo prazo.
O déficit financeiro da União, Estados e municípios atingiu a marca de R$ 78 bilhões em 2012. segundo dados do Ministério da Previdência Social. Ou seja, a arrecadação previdenciária não tem sido suficiente e os entes públicos estão retirando dinheiro do caixa para bancar as aposentadorias. Em 2011, essa conta era negativa em R$ 66,5 bilhões. Os valores para 2013 ainda não foram finalizados.
O financiamento das aposentadorias dos servidores públicos deixou em alerta o governo federal e o Tribunal de Contas da União (TCU). Muitos dos Estados e municípios ainda adotam o regime de repartição simples. Ou seja, os trabalhadores da ativa financiam os aposentados e pensionistas e, se faltar dinheiro, o governo local cobre a diferença.
Essa situação pode ocorrer porque Estados e municípios não têm muito espaço em seus orçamentos para absorver um aumento nos gastos com pessoal. A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) define um limite de gastos com pessoal em relação à Receita Corrente Líquida (RCL). O limite prudencial dos Estados é de 46,55%.
Levantamento feito por um grupo de trabalho criado para obtenção de novas receitas para o Regime Próprio de Previdência Social (RPPS) projeta que, neste ano, 13 Estados brasileiros estarão acima desse limite e outros 7 chegarão próximos do teto. Outros 7 Estados, de acordo com o diagnóstico, estariam abaixo do limite prudencial. O grupo de trabalho é formado por representantes de governos municipais, estaduais e federal.
O déficit financeiro do RPPS em 2012 está concentrado na União (R$ 57,6 bilhões) e Estados (R$ 33,7 bilhões). Para resolver a situação no longo prazo, o Executivo criou um fundo de previdência complementar para seus servidores e incentiva os Estados a fazer o mesmo. No caso dos municípios, os números consolidados mostram resultado superavitário de R$ 13,6 bilhões.
A preocupação do TCU é que os Estados e municípios tenham que recorrer à União para arcar com essa fatura, como já aconteceu no passado com as dívidas estaduais. O tribunal está finalizando uma auditoria sobre a situação do RPPS e deve fazer recomendações ao governo federal ainda este ano. Além disso, o TCU quer fazer parcerias com os tribunais estaduais e municipais para ter uma radiografia mais abrangente do problema.
O descasamento entre receitas e despesas no longo prazo pode se tornar ainda maior com o uso indevido das contribuições previdenciárias. O temor é que Estados que fizeram a lição de casa e optaram por um regime de capitalização da previdência retornem ao de repartição simples. Em regimes capitalizados, o recurso da contribuição é aplicado para garantir o pagamento futuro das aposentadorias, ou seja, o dinheiro é separado da conta do Estado e município.
Em Minas Gerais, o governo estadual conseguiu aprovar na Assembleia Legislativa a autorização para o uso do dinheiro da previdência de seus servidores e ter um alívio de caixa que permite elevar investimentos em um ano eleitoral. Procurada pelo Valor, a instituição previdenciária mineira não respondeu até o fechamento desta edição.
“O que fizeram em Minas Gerais nos deixou ainda mais preocupados”, disse o secretário de Políticas de Previdência Social, Leonardo Rolim. Ele teme que essa atitude se propague, o que geraria mais dúvidas sobre a sustentabilidade financeiras das previdências próprias. O déficit atuarial do regime próprio de previdência da União, Estados, Distrito Federal e municípios é de R$ 3,7 trilhões.
Dentre as ideias discutidas até o momento estão a criação de uma loteria – a Megaprev – e mudanças na distribuição do DPVAT, o seguro obrigatório de acidentes de trânsito, prevendo a destinação de 20% dos recursos às entidades gestoras dos regimes próprios nos Estados, municípios e Distrito Federal. Com a loteria instantânea, esses regimes receberiam um repasse anual de cerca de R$ 2,1 bilhões. Além disso, os governos regionais querem a desoneração do RPPS do pagamento do Pasep e mudanças nas regras para concessão de pensões.
Outra solução apontada por Rolim seria a criação de um fundo imobiliário, cujos rendimentos serviriam para sanar déficits nos regimes de previdência. “Já há pilotos no Mato Grosso e no Acre”, disse o secretário.
Nesses casos, o Estado faz um inventário de seus imóveis e os coloca em um fundo. Também podem entrar concessões de exploração sustentável de florestas, entre outros bens. Medidas como essa permitem ter dinheiro no presente “para pagar as dívidas do passado”, disse Rolim. No caso do Estado do Mato Grosso, o déficit financeiro é de R$ 300 milhões por ano.