Por Eduardo Laguna | De São Paulo
Ontem, a Mercedes-Benz voltou a paralisar seu complexo industrial em São Bernardo do Campo, no ABC Paulista, onde, além de caminhões e ônibus, são produzidos motores, eixos e câmbio. A montadora alemã – dona da segunda marca de caminhões mais vendida no país – já havia feito paradas de linhas por cinco dias em agosto e, agora, está negociando com o sindicato local alternativas para um excedente de 3,1 mil operários na fábrica – incluindo na conta 1,5 mil que estão dispensados até 17 de novembro, dentro do regime conhecido como “lay off”. Uma solução entre as partes é aguardada para os próximos dias.
Também em São Bernardo, a fábrica de caminhões da Ford continuará adotando em setembro a chamada semana curta – de apenas quatro dias de trabalho.
As dificuldades enfrentadas pelas montadoras irradiam para a cadeia de fornecedores, levando a paradas de produção ou corte de vagas. No mês passado, a Bosch eliminou 400 empregados na fábrica de bombas injetoras de Curitiba (PR), citando “diminuição significativa” nos pedidos de clientes do setor de veículos comerciais.
Na tentativa de impedir mais demissões na fábrica de motores em Guarulhos, na Grande São Paulo, a Cummins está adotando a semana de quatro dias de trabalho desde o início de agosto – válida tanto para o chão de fábrica como para as áreas administrativas. Até outubro, os operários da linha – cerca de 1,5 mil empregados – vão trabalhar de segunda a quinta, dentro de um acordo de três meses firmado com o sindicato local.
Junto com a jornada, o salário dos operários da Cummins foi reduzido em 15% no período. “Isso salva o emprego de mais de 200 pessoas”, diz Josinaldo José de Barros, vice-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Guarulhos.
Na virada do ano, a Cummins cortou 254 funcionários em Guarulhos e chegou a dar férias coletivas na unidade com a forte queda na produção de caminhões no país. Outros fornecedores, como a Meritor – que fabrica eixos em Osasco (SP) -, também fizeram ajustes mediante paradas pontuais de produção.
Em três cortes realizados desde abril, o governo reduziu de 10% para 2,5% ao ano os juros nos financiamentos de caminhões do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Os estímulos também vêm na forma de compras governamentais, com aquisições previstas de 8 mil caminhões – somando R$ 2,28 bilhões – para equipar as Forças Armadas e Estados com problemas climáticos.
Mas a reação das vendas não se dá de forma imediata, como aconteceu com os automóveis após o corte no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) em maio.
Além da resistência das transportadoras à nova linha de caminhões – menos poluentes, mas até 15% mais caros -, o mercado esbarrou na desaceleração da economia, principalmente na retração da atividade industrial.
O resultado foi uma queda de 39,4% na produção de caminhões nos sete primeiros meses do ano. No mesmo período, as vendas de caminhões cederam 17,4%, segundo balanço da Anfavea, a entidade que representa as montadoras instaladas no país.
Com a paralisia do mercado, a Scania parou a produção por 16 dias entre os meses de abril a julho. Em Resende (RJ), a MAN – líder de mercado com a marca Volkswagen – retirou o terceiro turno de produção e o volume diário de caminhões da linha cedeu de 350 para 240 veículos. No complexo da montadora, 270 operários foram dispensados até dezembro.
No mês passado, os emplacamentos de caminhões – de 11,4 mil unidades – subiram 4% na comparação com julho, mas ainda ficaram muito abaixo do volume de um ano antes, quando os fabricantes venderam 16,4 mil unidades.
Representantes da indústria projetam para este ano uma retração de 15% a 20% em relação ao volume recorde de caminhões vendidos em 2011: 172,6 mil unidades. As necessidades de investimentos em infraestrutura e perspectivas de aceleração da economia – combinadas à urgente renovação da frota brasileira – abrem expectativas positivas sobre a retomada no segmento de veículos pesados, mas fica a dúvida sobre a velocidade da reação e seus efeitos no curto prazo.
“O mercado vai se recuperar. A incógnita é se isso vai acontecer agora ou somente no ano que vem”, comenta Luis Afonso Pasquotto, presidente da Cummins na América do Sul.
A própria sucessão de medidas anunciadas pelo governo ajuda a adiar a recuperação porque, embora positivas, provocam uma paralisia do mercado no primeiro momento. Muitas transportadoras cancelam pedidos para, em seguida, refazer a compra sob condições mais vantajosas de financiamento do BNDES. O último corte nos juros do banco foi anunciado na quarta-feira.
“Isso pode voltar a acontecer, mas não existem muitos processos em andamento no BNDES. Em setembro, podemos ter uma mudança de trajetória”, acredita Alcides Braga, presidente da Anfir, a entidade que representa os fabricantes de implementos rodoviários.