Em julho de 1972, aconteceu na Suécia, a Conferência de Estocolmo que viria a acrescentar, definitivamente, o tema “ecologia” nas questões prioritárias da Organização das Nações Unidas. A Conferência foi um marco para as discussões sobre a relação entre meio ambiente e desenvolvimento.
Na esteira destas discussões, foi lançado em 1987 o Relatório Brundtland, intitulado “Nosso Futuro Comum” (Our Common Future), no qual se cunhou o termo desenvolvimento sustentável como o “desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias necessidades”. O documento apresentava uma visão crítica do modelo capitalista de desenvolvimento ressaltando a incompatibilidade entre a sustentação ambiental e os padrões de produção e consumo vigentes. Mais tarde estas questões seriam tratadas na Agenda 21.
Àquela altura a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente já estava sendo preparada e em dezembro de 1988 o Embaixador Paulo Nogueira Batista, representante permanente junto às Nações Unidas, fez um discurso histórico na Segunda Comissão da Assembleia Geral, no qual ofereceu o Brasil para ser a sede da Conferência de 1992. A possibilidade de um país emergente sediar o evento causou impacto e encontrou resistência nos países de capitalismo mais desenvolvido, como Suécia e Canadá.
Mas, a despeito das divergências, a Conferência foi realizada no Rio de Janeiro entre 3 e 14 de junho em 1992, sendo também conhecida como RIO-92 e ECO-92. Foi um grande evento, com representação de 175 países e ONGs, que teve como resultados os princípios da Convenção sobre Diversidade Biológica, da Convenção sobre Mudança do Clima, a Agenda 21, além do estabelecimento da Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e a Declaração dos Princípios da Floresta.
Diferente da Conferência de Estocolmo, a Rio 92 foi marcada pela presença maciça de Chefes de Estado e por um encontro paralelo no Aterro do Flamengo organizado por entidades civis. Aquele foi um sinal dos novos tempos, nos quais a sociedade civil e a questão ambiental ganhavam peso.
O encontro paralelo semeou um novo padrão de negociação nos âmbitos governamentais e empresariais, impondo a integração da sociedade civil, através dos seus grupos principais: mulheres, trabalhadores, movimento negro, de povos nativos, adolescentes e crianças, no processo.
Entre os 20 anos que separam a Conferência de Estocolmo e a Rio 92 houve uma depuração muito grande do tema, e hoje não há solução sem o conceito das três dimensões: o social, ambiental e o econômico.
As lutas socioambientais e as mobilizações contra o neoliberalismo dominaram a década de 1990. E as manifestações contra o encontro da Organização Mundial do Comércio, em Seattle, 1999, e a realização do 1º Fórum Social Mundial, em Porto Alegre, 2001, inauguraram o novo milênio.
Participação da Força Sindical na RIO 92
O XV Congresso da CIOSL (Confederação Internacional das Organizações Sindicais Livres), realizado em Caracas entre 17 e 24 de março de 91, teve como tema principal a questão ambiental. Era um claro sinal de que o sindicalismo mundial queria se inserir na Rio-92.
De acordo com esta tendência, a Força Sindical sempre pautou tal questão. Em junho de 1991, três meses depois de sua fundação, a Central publicou em sua 1ª revista um artigo intitulado “Defesa do Meio Ambiente” de autoria do economista e fundador do Partido Verde, Domingos Fernandes.
No artigo o autor frisa que, ecologia e meio ambiente, antes restritos a especialistas, eram temas que avançavam na sociedade. O argumento central do artigo é que os trabalhadores deveriam “abraçar o movimento ecológico, como principais interessados no processo produtivo e nos locais de trabalho” (Domingos, 1991).
Sua abordagem é inovadora por tratar de um assunto ainda pouco debatido naquele momento e por situar a especificidade do trabalhador neste debate.
Segundo o autor a preocupação com a saúde do trabalhador e com as condições de trabalho levou a Força Sindical a promover 1º Forum Internacional Eco-Sindical.
O Fórum, realizado em novembro de 1991, na Praia do Trabalhador, em São Sebastião (SP), foi organizado por um grupo designado pela Central, do qual faziam parte o economista Domingos Fernandes, os sindicalistas José Ibrahim e João Carlos,Juruna e o sociólogo José Gaspar Ferraz de Campos.
Participaram 470 dirigentes sindicais de todo o Brasil, sindicalistas europeus, além de deputados e ambientalistas.
No evento foram debatidos os temas:
1. Modernização tecnológica e politica industrial.
2. Amazônia e florestas tropicais.
3. Reforma agrária e meio ambiente.
4. Florestas: potencial econômico da biodiversidade.
5. Questão indígena.
6. Consumismo e exploração dos desejos.
7. As organizações nos locais de trabalho, saúde e meio ambiente.
8. Política agrícola e meio ambiente.
9. Microempresa: economia informal e cooperativismo.
10. Trabalho, meio ambiente e saúde.
11. As CIPAS (Comissões Internas de Prevenção de Acidentes) e o meio ambiente.
Agrupados em três grandes eixos:
1. Meio ambiente e desenvolvimento econômico.
2. Amazônia – floresta e questão agrícola.
3. Ecologia urbana – a cidade para se viver e trabalhar.
Dali sairiam propostas para apresentação na Rio 92. Estas propostas foram sistematizadas na chamada “Carta Eco-Sindical de São Sebastião” que orientou a Força Sindical na Conferência e em sua atuação nacional e internacional.
Além disso, entre 27 e 30 de maio de 1992, em São Paulo, a Força Sindical participou ativamente da preparação e execução da “Conferência Sindical Internacional Sobre Meio Ambiente e Modelos de Desenvolvimento”, organizada pela CIOSL/ORIT. Evento que aprimorou as resoluções definidas no Congresso sobre Meio Ambiente realizado pela CIOSL em 1991, definindo as posições defendidas pela organização na Rio 92, tanto na reunião de cúpula quanto no Fórum Paralelo.
A partir daí a Força Sindical se inseriu na Agenda da Rio 92 e instituiu o tema ambiental entre suas pautas prioritárias.
Agenda 21 da Rio 92 no Local de Trabalho
José Gaspar que foi o Secretario Executivo indicado pela Força Sindical para a Rio 92, a partir desta experiência escreveu o livro Agenda 21 da Rio 92 no Local de Trabalho (Editora Ilgu, 1995) obra inédita sobre a relação entre meio ambiente e trabalho.
O livro traz um histórico das Conferências sobre Meio Ambiente, elencando seus principais documentos e resoluções internacionais. Dentre estes, Gaspar destaca a Agenda 21, a qual se refere como “um dos documentos mais completos sobre meio ambiente e desenvolvimento sustentado”. O cerne da argumentação fundamental do livro, entretanto, é a situação do trabalhador e do mundo do trabalho inscritas nas entrelinhas do documento.
“Dos capítulos que compõe a Agenda 21, o que se destaca em relação ao papel do trabalhador e suas organizações sindicais é, sem dúvida, o Capítulo 29, ‘O Papel do Trabalhador e seus Sindicatos’. Porém, ao destacar o Capítulo 29, não podemos esquecer que existe, como já foi dito anteriormente (sic), todos os quarenta itens que compõem o Programa 21” (Campos, 1995). Dizendo isso Gaspar afirma que a questão do trabalho perpassa todo o debate sobre meio ambiente.
Segundo ele o estranhamento da questão ambiental no sindicalismo foi sendo superado aos poucos no decorrer da década de 1980 e o Grupo de Trabalho criado pela CIOSL sobre “Saúde, Segurança e Meio Ambiente”, foi decisivo neste processo. A partir dele diversas organizações sindicais realizaram conferências, estudos e seminários sobre meio ambiente, desenvolvimento e mundo do trabalho.
O casamento entre sindicalismo e meio ambiente se consolidou nas preparações para a Rio 92 e após ela. Mas absorção do tema encontrou relutância daqueles que taxavam o ambientalismo de elitista ou por aqueles que vislumbravam soluções dogmáticas para os problemas ambientais.
Para a Força Sindical, que já nasceu sob a égide da democracia e da organização da sociedade civil, entretanto, esta relação fluiu com naturalidade.
Conforme resoluções elaboradas na preparação da Rio 92, depuradas e debatidas até os dias de hoje, a Central defende que, ao se abordar a questão da poluição da produção industrial e da emissão de gases tóxicos, antes de tudo deve-se considerar o trabalhador que, em seu ofício, está em contato direto com estas substâncias nocivas. A sustentabilidade do meio ambiente,
Desta forma, deve estar contemplada neste primeiro contato com os agentes contaminantes. Trata-se de uma premissa irrevogável que encontra defendida no mote: Não há desenvolvimento sustentável sem Trabalho Decente.
João Carlos Gonçalves, Juruna, é Secretário Geral da Força Sindical
Milton Cavalo, é Secretário de Memória e Cultura da Força Sindical e Presidente do Centro de Memória Sindical