Genebra: Produção se desloca para outros países, diz Gomes da Silva

A excessiva valorização do real está transformando alguns setores da indústria brasileira virtualmente em “maquiladoras” e também empurra empresas a deslocar produção para outros países, relatou ontem o empresário Josué Gomes da Silva na Organização Mundial do Comércio (OMC).

Único brasileiro convidado para falar no seminário sobre câmbio e comércio, Gomes da Silva deu o exemplo de sua companhia, a Coteminas, maior produtora têxtil do país. Por causa do câmbio, as exportações caíram de US$ 400 milhões para US$ 70 milhões em cinco anos. “Tivemos que deslocar a produção para outros países”, disse. A holding CTNM – que detém a Santanense e a Springs Global (embaixo da qual estão Mmartan, Springs Global e Coteminas) – tem cinco unidades nos Estados Unidos, uma no México, uma na Argentina e 12 no Brasil.

Na sessão que ouviu o setor privado, o empresário disse que problemas de infraestrutura, complexidade tributária e juros altos contribuem para reduzir a competitividade da indústria brasileira. Mas o maior culpado é o câmbio.

“Reconhecemos que há outros problemas, mas posso assegurar a vocês que o desalinhamento das taxas de câmbio está no coração dos problemas que o setor industrial enfrenta no Brasil”, afirmou. Ele exemplificou dizendo que a indústria de eletrônicos no Brasil se tornou virtualmente uma “maquiladora”, com as importações equivalendo a mais de 60% da produção local. O país deixou de ser o quinto maior produtor de máquinas e equipamentos, caindo para a 14ª posição. O setor químico teve déficit de US$ 26 bilhões. Mesmo em setores nos quais o Brasil era muito competitivo, como papel e celulose, as importações mais que dobraram em dois anos.

Em 2011, o déficit comercial do Brasil com manufaturados atingiu US$ 92,5 bilhões, comparado a um superávit de US$ 5,1 bilhões seis anos atrás, e continua subindo. O saldo comercial total, de US$ 30 bilhões em 2011, deve-se essencialmente às commodities. Gomes da Silva contou que até ele foi obrigado a importar da China, para atender seus clientes nos EUA.

As exportações têxteis da Coteminas cresceram 535% entre 2001 e 2007, incluindo produtos para abastecer as operações nos EUA. A situação se reverteu a partir de 2008 e as exportações voltaram ao nível de 2001. Por causa do duplo efeito do câmbio – real valorizado e moeda da China desvalorizada -, a Coteminas teve que abastecer suas operações nos EUA e tornou-se um intermediário no comércio têxtil naquele mercado.

A empresa constatou que, sem poder exportar de suas fábricas do Brasil, a estrutura do varejo americano acaba impondo muito risco e pouca margem. A empresa resolveu “dar um passo atrás” e se concentrar no que pode produzir nos EUA, que são cobertas para colchões e travesseiros, por exemplo. A operação nos EUA gera negócios de US$ 600 milhões por ano.

Para Gomes da Silva, a OMC precisa determinar um mecanismo para corrigir essa situação que, segundo ele, ameaça o próprio crescimento a longo prazo da economia. A África do Sul concordou com o Brasil, exemplificando que sua moeda se valorizou mais de 35% nos últimos tempos, afetando duramente sua indústria e empurrando o desemprego para 25%.