Por César Felício | De Buenos Aires
Uma paralisação de caminhoneiros gerou um agudo desabastecimento de gás na Argentina e levou o governo a anunciar um drástico racionamento para o setor industrial. A situação deverá se normalizar até sábado. Mas a situação continua tensa. Apesar de ter obtido o reajuste salarial de 25,5% pretendido pelo caminhoneiros, o presidente da CGT, Hugo Moyano, anunciou uma greve geral para a próxima quarta-feira.
Essa seria a primeira greve geral no governo da presidente Cristina Kirchner. Mas a central sindical CGT está dividida e apenas os sindicatos alinhados a Moyano devem aderir ao protesto.
O ato irá culminar em uma manifestação na Praça de Maio, em frente à Casa Rosada, e a principal reivindicação atinge diretamente o governo argentino: os sindicalistas pedem a correção da tabela do imposto de renda, que hoje taxa todo argentino solteiro que ganhe mais que 5.800 pesos (cerca de R$ 2.900) ou casado que receba mais de 8.000 pesos (R$ 4.000).
“O salário já ficou para um segundo plano. O reajuste não serve de nada sem o aumento da isenção. Peço à presidente que deixe a soberba de achar que pode fazer o que quiser porque recebeu 54% dos votos no ano passado”, disse o sindicalista em entrevista coletiva.
O protesto acontecerá na véspera da cúpula do Mercosul, em que Cristina receberá os presidentes do Brasil, Uruguai, Bolívia, Peru, Colômbia, Chile e Equador em Mendoza. A presença do venezuelano Hugo Chávez, em tratamento contra o câncer; e do paraguaio Fernando Lugo, que sofre um processo de impeachment, é incerta.
Ao mirar o reajuste da faixa de isenção, cuja variação não acompanha a inflação extraoficial da Argentina, em torno de 25% ao ano, Moyano expôs a situação fiscal delicada da Argentina. Ontem mesmo, em uma reunião organizada às pressas em Buenos Aires, os governadores oficialistas fizeram um apelo para que a isenção não seja corrigida, já que reduz diretamente os repasses para as províncias (governos estaduais).
A manifestação de quarta coloca Moyano em situação de vantagem na disputa pela condução da CGT, que renovará a sua direção em um congresso em 12 de julho. O sindicalista, em confronto aberto com a presidente desde 2010, tem a sua reeleição contestada pelas principais categorias do país, que querem a eleição do metalúrgico moderado Antonio Caló.
“É um lance de esperteza dele, já que todos os sindicatos defendem a correção da isenção, mas de modo algum os moderados se somarão a uma paralisação nacional”, comentou o secretário de relações internacionais da Federação dos Comerciários, Ruben Cortina, da ala antimoyanista.
A greve dos caminhoneiros de ontem provocou pânico no governo de Cristina. Pela manhã, o ministro do Planejamento Julio de Vido determinou o corte do fornecimento de gás para as indústrias de 48 milhões de metros cúbicos para apenas 23 milhões de metros cúbicos por dia, uma iniciativa que, segundo o próprio ministro, “paralisa grande parte da indústria nacional”.
Segundo de Vido, o corte era necessário para garantir o abastecimento do setor residencial, já que o governo teria que paralisar as atividades nas usinas térmicas movidas a óleo diesel, que dependem da atividade de transporte, e aumentar a geração das térmicas a gás. Com o acordo salarial anunciado horas depois pela Federação das Empresas de Transporte de Carga e a determinação de Moyano de suspender o bloqueio às refinarias de combustível, a situação deverá estar normalizada até sábado, segundo previsão da entidade patronal de distribuição de combustíveis.