Escassez de mão de obra e desemprego baixo vão dar suporte às reivindicações salariais, mas empresas dizem que já estão no limite
MARCELO REHDER
Os aumentos de salários acima da inflação devem continuar pressionando o custo da indústria, apesar do crescimento anêmico do Produto Interno Bruto (PIB) este ano. Em 2013, dizem os especialistas, a tendência de alta nos ganhos salariais será sustentada pela manutenção de fatores como o desemprego baixo e a escassez de mão de obra qualificada, em um cenário de crescimento econômico maior que o de 2012. A indústria, porém, reclama de perda de competitividade e fala em trocar homens por máquinas nas linhas de produção.
“Existe uma competição muito acirrada no mercado de trabalho que obriga a indústria a conceder reajustes mais fortes para não perder mão de obra já treinada para o setor de serviços”, diz o economista Caio Machado, da LCA Consultores.
O diretor de competitividade e tecnologia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), José Ricardo Roriz Coelho, afirma que a situação de boa parte da indústria não permite mais aumentos reais de salário. Ele alega que as empresas não conseguem absorver novos aumentos de custo nem repassá-los aos preços por causa da concorrência internacional.
“Existe um limite para isso, e acho que nós chegamos a esse limite”, diz Roriz Coelho. “Quando o salário começa a aumentar muito, a saída é investir em equipamentos que usam menos mão de obra.”
Na semana passada, o ex-presidente do Banco Central, Gustavo Franco, hoje no comando da Rio Bravo, chamou a atenção para a situação de empresas que estão passando por dificuldades para gerar receita, o que num ambiente de alta carga tributária pode elevar a taxa de desemprego no curto prazo.
“Há empresas enforcadas. Há indício de que o mercado de trabalho tem de se ajustar para arrumar a economia. E é provável que isso poderá ocorrer no início do próximo ano”, diz o economista.
Nem em pesadelos os sindicalistas admitem abrir mão do aumento real dos salários neste momento. Para o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, Miguel Torres, eventuais demissões em massa seriam um tiro no pé das próprias empresas e da economia brasileira como um todo.
O sindicalista argumenta que o Brasil se deu bem em relação a outros países por ter combatido a crise internacional com aumento de emprego e salário. “Quem recorreu à automatização e diminuição de postos de trabalho está hoje numa crise da qual não sai tão cedo.”
Os ganhos salariais estão batendo recorde este ano. Levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese)mostra que 96,5% dos reajustes no primeiro semestre ficaram acima da inflação. Foi o melhor desempenho desde 1996, quando o estudo começou a ser feito. A média de ganho real, também recorde, ficou em 2,23%.
Os ganhos reais em torno de 2% foram mantidos no segundo semestre, puxados pelas negociações de grandes categorias. Os 750 mil metalúrgicos da Força Sindical no Estado de São Paulo, por exemplo, receberam reajuste salarial de 8% no mês passado, que representou aumento real de 2%. “Não fossem os aumentos reais de salário, o PIB ficaria ainda pior”, diz Torres, referindo-se às projeções do mercado que indicam crescimento na faixa de 0,8% a 1% para este ano.
Sem muita margem para corte de custos, as empresas vão acabar tendo de repassar o aumento dos salários para os preços, avalia o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale. O movimento é favorecido pela valorização do dólar em relação ao real, que acumula ganho de 12% no ano.
“O câmbio ao redor de R$ 2, indo para um patamar de R$ 2,10 abre espaço para repasses de custo sem perda de vendas para a concorrência internacional, já que o preço do produto brasileiro, em dólares, ficou mais barato.”
COLABOROU RICARDO LEOPOLDO