A renda no Brasil está ainda mais concentrada do que indica a Pesquisa por Amostra de Domicílios (PNAD), feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Dados das declarações de imposto de renda das pessoas físicas (DIRPF), divulgados recentemente pela Secretaria da Receita Federal, mostram que as pessoas mais ricas possuem uma ruma renda cerca de 2,5 vezes maior do que a apontada pela PNAD.
Essa diferença acontece, segundo os economistas Sérgio Gobetti e Rodrigo Orair, pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), que analisaram os dados das DIRPF, porque a pesquisa do IBGE não capta toda a renda das pessoas, principalmente daquelas situadas no topo da pirâmide social, que recebem rendas provenientes do capital (como lucros e dividendos, por exemplo). “A PNAD subestima a renda dos mais ricos de modo bastante acentuado”, disse Gobetti.
O número de pessoas que, segundo a PNAD, ganham mais de três salários mínimos foi de 20.733.283 em 2012, número muito parecido com o das DIRPF, que foi de 220 milhões de pessoas em quatro grupos – aqueles que ganham de 3 a 5 salários mínimos, de 5 a 10 SM, de 10 a 20 SM e mais de 20 SM – os números ficam bastante diferentes.
Para a PNAD, existem mais pessoas na faixa de 3 a 5 salários mínimos e muito menos na faixa de mais de 20 salários mínimos. Isto ocorre, de acordo com Gobetti e Orair, porque a PNAD subestima a renda do capital e só capta de maneira mais precisa a renda do trabalho. Dessa forma, se uma pessoa tem uma remuneração mensal equivalente a 5 salários mínimos e recebe mais 1 salário mínimo de lucros e dividendos ou outra renda do capital, a pesquisa do IBGE pode captar só os valores relativos ao salário e classificará o cidadão na faixa de 3 a 5 salários mínimos, quando na verdade, pelos dados das DIRPF, a renda da pessoa é de 6 salários mínimos.
“Quanto mais subimos na pirâmide social, maior é a diferença entre a renda estimada pela PNAD e a ‘verdadeira’ renda demonstrada nas DIRPF”, explicou Gobetti. Na faixa do 1% mais rico, que se situa “em torno” daqueles que ganham acima de 30 SM, por exemplo, a diferença chega a 2,5 vezes, aproximadamente. A razão para a PNAD subestimar a renda dos mais ricos é que se trata de uma pesquisa que depende da resposta das pessoas, e os mais ricos podem tanto não querer declarar sua verdadeira renda ou têm dificuldade de saber quanto ganham em dividendos e juros sobre aplicações financeiras, observou.
A pesquisa do IBGE diz que a renda média do 1% mais rico no país foi de R$ 214 mil por ano em 2012. Os dados sobre a renda das DIRPF são estratificados de acordo com o número de salários mínimos. Os que ganham acima de 20 SM correspondem a cerca de 1,5% da população economicamente ativa, estimam os economistas.
A renda média anual dos 1,5% mais ricos do país estava em R$ 407 mil em 2012, de acordo com a DIRPF. Os que ganhavam acima de 40 SM representavam 0,5% da população ativa, com um salário anual médio, de acordo com a DIRPF, de R$ 816 mil. A renda anual do 1% mais rico situa-se, portanto, entre R$ 550 mil e R$ 600 mil.
Outra informação preciosa que está na DIRPF, e que também ilustra a concentração de renda no Brasil, é que apenas 71.440 pessoas tiveram rendimentos de R$ 298 bilhões em 2013, o que correspondia a 14% da renda total. Para esses muito ricos, que ganham acima de 160 salários mínimos por mês, a renda anual média individual foi de R$ 4,17 milhões.
Esse pequeno grupo de cidadãos, que representava apenas 0,05% da população economicamente ativa e 0,3% dos declarantes do imposto de renda, possuía naquele ano um patrimônio de R$ 1,2 trilhão. Esse valor representava 22,7% de toda a riqueza declarada por todos os contribuintes em bens e ativos financeiros.
Os dados da DIRPF foram divulgados na página da Receita Federal na internet no fim do mês passado. O economista francês Thomas Piketty não teve acesso a eles, antes de fazer o livro “O capital no século XXI”. Agora, se fizer uma segunda edição da obra, Piketty poderá incluir o Brasil em seu estudo.