Folha de S.Paulo
Sancionada ontem, medida cassa inscrição no cadastro do ICMS, o que impede a operação
Punição vale em toda a cadeia produtiva; compradores podem ser responsabilizados por falha de fornecedores
AGNALDO BRITO DE SÃO PAULO
O Estado de São Paulo sancionou ontem a lei que vai fechar empresas instaladas em seu território que se utilizem do trabalho análogo à escravidão no processo produtivo.
A medida atinge empresas que usam direta ou indiretamente esse modelo em qualquer elo da cadeia produtiva, conforme antecipado pela Folha em novembro de 2012.
Como não pode legislar sobre matéria trabalhista (prerrogativa da União), o Estado aplicará medida que inviabiliza a operação da empresa: a cassação da inscrição estadual no cadastro do ICMS.
Sem isso, a empresa não pode emitir nota fiscal, o que inviabiliza a operação comercial. A lei nº 1.034, sancionada ontem pelo governador Geraldo Alckmin, determina que a empresa será proibida de voltar ao ramo de atividade durante dez anos.
As companhias poderão ser responsabilizadas por problemas com a terceirização ou a quarteirização da mão de obra -quando o terceirizado subcontrata outra empresa para fabricar o item encomendado.
CATIVEIROS
As empresas terão que acompanhar a produção de quem lhes fornece. “Quem contrata tem de saber se está contratando alguém que se utiliza de trabalho escravo. A empresa pode ser responsabilizada”, afirmou Eloísa de Sousa Arruda, secretária estadual de Justiça e Cidadania.
“Nosso Estado não abriga cativeiros, abriga fábricas. Fábricas que não produzem grilhões, mas geram empregos”, disse o governador.
A lei tenta atingir a empresa economicamente. Levantamento do Ministério Público do Trabalho mostra que um funcionário contratado em condições análogas à escravidão numa confecção custa, ao mês, R$ 2.348,17 menos do que outro regularmente registrado.
“O objetivo é eliminar essa vantagem e acabar com essa disputa desleal”, disse Carlos Bezerra Jr., deputado estadual do PSDB, autor do projeto de lei efetivado ontem.
O Estado mais rico do país ainda sustenta o chamado trabalho escravo urbano. São Paulo tem hoje entre 300 mil e 400 mil imigrantes bolivianos, peruanos e paraguaios.
“Apenas um terço desse contingente é de imigrantes legais. Dois terços são, provavelmente, usados por alguns setores como mão de obra escrava”, disse Luiz Fabre, encarregado do núcleo paulista do Ministério Público do Trabalho (MPT) para o combate ao trabalho escravo.
Segundo ele, o setor agropecuário e as indústrias têxtil e da construção civil submetem, com certa frequência, trabalhadores à situação análoga à escravidão, mediante o uso do trabalho forçado, servidão por dívida, jornada exaustiva ou trabalho degradante.
Luiz Camargo, procurador-geral do MPT, espera que os demais Estados sigam o exemplo de São Paulo. O MPT tenta aprovar a proposta de emenda constitucional 438, aguardando votação no Senado. A proposta prevê a expropriação de fazendas onde houver o uso comprovado de trabalho escravo.