Janes Rocha | do Rio
Os homens ainda são maioria no campo dos negócios por conta própria no país. Mas a participação das mulheres aumentou 20% nos últimos dez anos, de acordo com as estatísticas oficiais mais atualizadas do IBGE, relativas a 2011. A Pesquisa Nacional de Amostragem por Domicílio (PNAD) apontou que o Brasil tem 22,8 milhões de empregadores e trabalhadores por conta própria, dos quais sete milhões (ou 31%) são mulheres. Em 2001 elas eram 5,8 milhões.
Dizer que as mulheres estão tomando todos os espaços no mundo já virou lugar comum. O que foge um pouco ao comum é o tamanho de sua participação no empreendedorismo brasileiro. Pesquisa anual realizada pelo Global Enterpreneurship Monitor (GEM), organização internacional de monitoramento do empreendedorismo, mostrou que, em 2011, a proporção de mulheres entre os empreendedores em estágio inicial no Brasil ficou em 49%, maior que a média mundial, de 37%, e a quarta maior entre os 54 países estudados.
Por um conceito mais amplo adotado pelo GEM, as mulheres já estariam praticamente equiparadas aos homens enquanto grupo de empreendedores. Pelo levantamento, em 2011, os homens somavam 51,38% dos empreendedores iniciais e as mulheres, 48,62%. Entre os já estabelecidos, a proporção era 56,93% para 43,01%.
Enquanto a PNAD contabiliza empresas oficiais, constituídas como tal, o GEM toma por base desde as pessoas que começaram a empreender há apenas três meses e meio (e que não necessariamente já abriram uma empresa formal) até aquelas que têm mais de três anos e meio como empresários. Sob qualquer aspecto que se olhe, entretanto, a participação da mulher como empreendedora é cada vez maior. “Vem crescendo desde o início do nosso estudo, até que chegamos ao ponto de quase equiparação”, afirma Simara Maria Greco, coordenadora de projetos do Instituto Brasileiro da Qualidade e Produtividade (IBQP), entidade que representa o GEM no Brasil.
As estatísticas do IBGE apontam um pequeno recuo em 2011 no número de mulheres empreendedoras – há uma interrupção em 2010, quando a PNAD não foi realizada em função de mudanças no censo. Mas para o economista Carlos Alberto dos Santos, diretor-técnico do Sebrae, essa diferença para menos não altera a tendência de longo prazo. “Desde a década de 60 tem havido um aumento da participação das mulheres em todos os campos da sociedade”, afirma o executivo do Sebrae. “No campo dos novos negócios não seria diferente”, completa.
Os setores preferidos por elas na hora de empreender são os de saúde e beleza, acessórios pessoais, refeições rápidas, vestuário, alimentos especiais, móveis e decoração, nas seis primeiras colocações de um ranking de dez posições elaborado pela Rizzo Franchise, consultoria especializada em estruturação e implantação de redes de franquias, que acompanha esse mercado há mais de 20 anos.
Foi no ramo número um do ranking da Rizzo, o de saúde e beleza, que Cristiana Arcangeli se destacou. Consultora multimídia em beleza e qualidade de vida, Cristiana começou sua vida profissional como dentista nos anos 80, hoje é uma conhecida empresária de sucesso, à frente de um grupo de empresas de cosméticos que deve fechar 2012 com faturamento próximo a R$ 20 milhões, quase 50% mais que em 2011.
Cristiana foi quem criou, nos anos 90, a Phytoervas, posteriormente vendida para a multinacional farmacêutica Bristol-Myers Squibb. Ela também foi a primeira a instalar uma distribuidora de cosméticos internacionais no país, com marcas como Chanel, Bulgari, Clinique e Carolina Herrera. Depois, em 2006, criou a Éh! Cosméticos. Em 18 meses vendeu-a para a Hypermarcas.
Agora Arcangeli pilota a beauty´in, uma marca de produtos de uma nova categoria, os “aliméticos”, um conceito também criado por ela. Com a beauty´in, Cristiana fez uma fusão entre o ramo de sua especialidade, o de cosméticos, com o de alimentos. A expectativa para 2013 é dobrar as receitas, pois pela primeira vez, com a beauty´in, Cristiana Arcangeli pretende exportar seus produtos.
Quatro contêineres do beauty´drink, bebida de preparo instantâneo à base de chás orgânicos com vitaminas e sais minerais, já estão encomendados para o Kwait. A nova linha também será exportada em todas as suas modalidades (barras de cereais, balas e bebidas) para a cadeia inglesa Selfridges onde será vendida em um balcão próprio. “Gosto de fazer coisas novas; inovação é o meu grande barato”, diz a empresária.
Também no setor de franquias houve um aumento da participação feminina. Segundo dados da pesquisa da Rizzo, o número de mulheres no comando de franquias aumentou de 50.244 em 2009 para 65.444 em 2011, um avanço de mais de 30% em um universo de 136,3 mil franqueados individuais.
A Rizzo analisou ainda a performance da mulher no comando do negócio em comparação com os homens. Um estudo envolvendo 127 empresas franqueadoras avaliou dois itens, faturamento e rentabilidade, nos últimos quatro anos. “A conclusão é que a performance das mulheres é 24% superior à dos homens, em faturamento, e 32% em rentabilidade”, diz Marcos Rizzo, sócio diretor da consultoria. Após dissecar esses dados, Rizzo concluiu que o desempenho é melhor devido a três pontos principais. Primeiro o maior envolvimento e participação das mulheres; maior fidelidade ao negócio e uma postura mais humilde, disposta a aprender. “O homem tem uma postura de ´já sei´. A mulher tem uma postura de ´quero aprender´. O homem não admite que não sabe”, afirma Rizzo.
Ricardo Camargo, diretor-executivo da Associação Brasileira de Franchising (ABF), observa ainda que as mulheres atendem melhor os clientes, são mais educadas e têm um nível de observação de detalhes maior que o dos homens, o que pode fazer toda a diferença para o resultado das vendas, dependendo do tipo de negócio. Para Cristiana Arcangeli, as mulheres são mais detalhistas e apaixonadas. “O homem faz mais conta”.
Segundo esses especialistas, não há uma explicação só para o crescimento da participação da mulher no empreendedorismo. Camargo acha que as mulheres encontraram uma maneira de driblar a eterna desvantagem salarial em relação aos homens no mercado de trabalho. “Em franquias elas têm a chance de ganhar mais”, afirma. Outro motivo pode ser um “volta para casa” depois de duas décadas tentando dividir espaço com os homens nas fábricas e escritórios. “Vivemos hoje no Brasil o que aconteceu no final da década de 70 nos Estados Unidos, as mulheres quiseram voltar para mais perto de casa, para ficar mais próximas dos filhos e da família”, aposta Marcos Rizzo.