As mulheres são maioria entre os beneficiários da Previdência Social no Grande ABC. O cenário, no entanto, nem sempre foi assim. Elas assumiram a liderança no volume de concessões do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) a partir de 2012 e, desde então, passaram a responder pela maior parte das aposentadorias e pensões. Entre 2008 e 2018, houve crescimento de 43,82% nas concessões às mulheres, e de 28% aos homens. Hoje, o sexo feminino responde por 51,58% do total dos 554.811 benefícios. Apesar disso, elas sofrem mais com o fator previdenciário, podendo perder até 40% do valor. Os dados foram levantados pelo INSS a pedido do Diário.
Yara Ferraz
Ao analisar a quantidade de benefícios concedidos às mulheres nas sete cidades, em janeiro de 2008 haviam sido 198.998, número que, à época, representava 48,66% do total de 408.884 registros. De lá para o primeiro mês do ano, houve crescimento de 87.191 aposentadorias e pensões, para 286.189.
No mesmo período, a diferença entre as concessões para os homens foi de 28%, ou 58.736, passando de 209.886 a 268.622.
Para especialistas, o aumento é reflexo das mudanças no mercado de trabalho nas últimas décadas, que passou a contar com maior presença feminina. “Em anos anteriores, a mulher não estava tão presente no mercado de trabalho. E isso acaba refletindo principalmente na aposentadoria, porque, antes, elas geralmente recebiam o benefício de pensão, mas não o de aposentadoria, ou os dois. Hoje, quem está se aposentando são as mulheres que começaram a trabalhar há 30 ou 40 anos”, justifica a advogada especialista em Direito Previdenciário Priscila Simonato.
O advogado especialista em Direito Previdenciário Thiago Luchin, sócio do escritório Aith, Badari, Luchin Advogados pondera que elas buscam mais informações sobre os benefícios. No escritório, o registro de atendimentos direcionados ao público feminino é 10% maior do que o masculino.
Luchin também acredita que houve reflexo no aumento de pedidos de aposentadoria de donas de casa, por exemplo, além da questão do mercado de trabalho. Antes, isso não era usual, e as mulheres do lar tinham como fonte de renda apenas a pensão de seus maridos. “Também há reflexo da alta nos pedidos de pensões e aposentadorias por idade. As mulheres estão buscando mais os seus direitos, somando os benefícios por idade com as concessões de pensão. O fato de a expectativa de vida delas ser maior também reflete na somatória”, afirma. Vale lembrar que, desde 2017, não é mais possível acumular pensão e aposentadoria, sendo necessário optar pelo benefício mais vantajoso.
FATOR PREVIDENCIÁRIO – Além da desigualdade de salários presente no mercado de trabalho, já que muitas vezes as mulheres recebem menos do que os homens – ainda que desempenhem a mesma função –, elas sofrem mais com o fator previdenciário. A fórmula que considera idade, expectativa de vida e tempo de contribuição pode diminuir o valor das aposentadorias em torno de 30%, mas as mulheres podem perder até 40% do valor mensal. Isso porque elas vivem mais, em média 79,4 anos, enquanto que, eles, 72,2 anos.
O diretor de políticas sociais da Associação dos Trabalhadores Aposentados e Pensionistas do Grande ABC, Luís Antônio Ferreira Rodrigues, explica que quando não se usa a fórmula 85/95 (soma de tempo de contribuição e idade, onde o resultado deve ser 85 para a mulher e 95 para o homem, e é eliminado o fator), a mulher tem grande perda. “Se a mulher começou a trabalhar com 20 anos e se aposentou com 50, não dá 85. Supondo que ela ganha cerca de R$ 2.000 mensais, perde 40%, já que o benefício vai para R$ 1.200. Agora, considerando homem que começou com 20 e está com 55 anos, e recebe R$ 3.000, já considerando a desigualdade salarial, com a soma vai ter 90, então recebe R$ 2.100, ainda assim R$ 900 a mais”, explicou.
Aposentada por idade desde novembro do ano passado, a moradora de São Bernardo Vânia Elizabeth Staurenghi, 69 anos, chegou a cursar pedagogia e a trabalhar como secretária. Ela contribuiu individualmente mesmo após parar de trabalhar, há cerca de 40 anos. O valor do benefício é de um salário mínimo (R$ 954), já o do marido, que se aposentou por tempo de contribuição e trabalhava como engenheiro, gira em torno de R$ 2.000. “Eu acredito que ainda tenha essa desigualdade, minha irmã é formada em Pedagogia e sempre deu aula, mas também recebe um salário minimo. Isso porque ela trabalhou mais tempo do que eu.” Mesmo assim, Vânia conta que o benefício faz a diferença, já que por ser diabética tem altos gastos mensais com remédios e mantimentos. “Sempre ajuda porque tenho muitos gastos, e é necessário complementar a renda”, disse.
Total de registros cresceu em 35,69% de 2008 a 2018
O número de benefícios concedidos, somando os de homens e mulheres, cresceu 35,69% na região. De acordo com dados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), houve salto de 408.884 registros em janeiro de 2008 para 554.811 em 2018.
Conforme já noticiado pelo Diário, especialistas afirmam que a corrida para se aposentar antes da reforma previdenciária, que agora não tem mais data para entrar em votação, contribuiu para o aumento da concessão de benefícios.
“A questão maior é a insegurança que as pessoas têm em relação à mudança, então, elas acabam fazendo mesmo que não valha a pena, apenas para garantir. Além disso, hoje um benefício é concedido mais rápido do que alguns anos atrás, quando tudo era feito manualmente. A lei fala em 45 dias para tudo estar pronto. Porém, com todas as informações no CNIS (Cadastro Nacional de Informações Social) em mãos, dá para resolver em até 15 minutos, e isso faz com que consigam atender mais pessoas”, explica a professora de Direito da Universidade Metodista de São Paulo Roseli dos Santos Martins.