MEC apresentou nesta terça-feira documento que irá nortear currículos do país
O Ministério da Educação (MEC) apresentou nesta terça-feira a terceira versão da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) do ensino médio. O documento será responsável por dar as diretrizes da parte comum do currículos de todo país, correspondendo a 60% da carga horária da etapa.
O texto traz uma estrutura diferente, com a separação do ensino por áreas (Ciências Humanas, Ciências da Natureza, Linguagens e Matemática) e apenas português e matemática como componentes curriculares (disciplinas). A BNCC foi entregue pelo MEC ao Conselho Nacional de Educação (CNE), que ficará responsável por realizar audiências públicas e fazer contribuições ao documento.
– O Brasil era o único país do mundo com um ensino médio engessado, com 13 ou 14 disciplinas obrigatórias, um currículo determinado. Esse modelo de hoje está em funcionamento há muito tempo e os resultados são tristes – afirmou a secretária-executiva do MEC, Maria Helena Guimarães.
Na nova versão, o MEC propõe habilidades a serem desenvolvidas em cada área do conhecimento de maneira interdisciplinar, ou seja, fica a cargo das redes de ensino identificarem quais delas dizem respeito a cada disciplina. Somente português e matemática trazem conteúdos específicos explícitos no texto. Na versão anterior do texto, a BNCC trazia as disciplinas separadamente, na época o MEC esqueceu de incluir as matérias de história e geografia.
O Ministério acredita que dessa forma as redes terão mais liberdade para flexibilizar seus currículos e oferecerem um ensino interdisciplinar. Em entrevista ao GLOBO, a secretária-executiva da pasta, Maria Helena Guimarães, afirmou que professores de diversos estados foram consultados e aprovaram o modelo. O ministro Mendonça Filho defendeu que a BNCC será um instrumento fundamental para colocar a reforma do ensino médio em andamento.
– A reforma do ensino médio casa com esta Base Curricular que está sendo apresentada. A reforma estava em debate há bastante tempo no Brasil e nós conseguimos assegurar aos jovens brasileiros o mesmo formato que existem em países como EUA, Canadá, nações europeias e asiáticas- disse o ministro. – O Brasil não poderia evoluir na questão educacional se nós mantivéssemos um ensino médio que estabelece um padrão único para todos e não considera os projetos de vida, as vocações individuais.
A área de linguagens e suas tecnologias traz 7 competências gerais e 27 habilidades que se articulam em temas de artes, educação física e inglês. Além disso, há o componente curricular de língua portuguesa, que agrega outras 53 habilidades. Na parte de Matemática há cinco competências gerais para área e 63 habilidades a serem desenvolvidas.
Em Ciências da Natureza, os estudantes devem desenvolver três competências e 23 habilidades, que estão atreladas a biologia, física e química. Na área de Ciências Humanas, há seis competências e 31 habilidades relacionadas a história, geografia, filosofia e sociologia.
‘Implementação do modelo deve ser cuidadosa’, diz especialista
Para a presidente-executiva do movimento Todos pela Educação, Priscila Cruz, a nova estrutura proposta pela BNCC é positiva, mas a implementação do modelo deve ser cuidadosa para não gerar desigualdades.
– A estruturação por aéreas é algo defendido há muito tempo como forma de dar mais sentido aos conhecimentos trabalhados na escola e para facilitar projetos pedagógicos em que os alunos são mais protagonistas na construção de seus aprendizados. O risco é a implementação, que em vez de tornar esse novo ensino médio uma oportunidade para elevarmos o patamar de aprendizagem dos alunos, pode empobreêe-lo, torná-lo ainda menor- argumenta.
Priscila lembra que em outras políticas públicas na área de educação o país já transformou uma boa iniciativa em um projeto ruim:
– Temos que levar em consideração a tendência que temos de implementar o formato reduzido das propostas, descaracterizando-as. Veja o exemplo da Progressão Continuada que se tornou, na implementação, Aprovação Automática.
Nesse sentido, o trabalho dos estados será fundamental, já que a BNCC não é o currículo em si e apenas diretrizes que servem como base para a construção destes. Assim, será de responsabilidade das redes estaduais confeccionarem seus documentos específicos.
– As redes, que contratam os professores, deverão elaborar os seus documentos curriculares e depois alocar as responsabilidades para os professores de cada disciplina. Ou seja, uma habilidade será trabalhada por diversos professores, mas cada um deles terá objetivos distintos. Isso depende dos currículos – opina Priscila.
De acordo com Maria Helena, a proposta feita pelo MEC também alinha o ensino da etapa ao que é recomendado a nível internacional para facilitar o diálogo entre a vida acadêmica do aluno e o mercado profissional.
– Mobilizar competências, habilidades, atitudes e valores para os alunos em relação ao mundo do trabalho é um grande desafio. Os debates da Unesco e da OCDE têm enfatizado questões como: quais as profissões que continuarão a existir no futuro? Como preparar as crianças e os jovens para o mundo do futuro, muito diferente, em que vivemos uma quarta – alguns falam até em quinta – Revolução Industrial. Há uma enorme imprevisibilidade do ponto de vista da formação, daquilo que se espera dos nossos alunos – destacou.
O presidente do CNE, Eduardo Deschamps, comemorou o fato de o país finalmente confeccionar uma diretriz para ser implementada em todo território nacional.
– Na questão do currículo, para um país como o Brasil, de dimensões continentais, dificilmente você vai ter um currículo igual de norte a sul. O encaminhamento da Base Nacional Comum Curricular é um marco para a educação do Brasil. O documento serve de referência para que cada rede elabore seu currículo. A autonomia de cada secretaria será sempre respeitada – disse.
Os itinerários: núcleo flexível
Os 40% restantes da carga horária do ensino médio são dedicados à parte flexível e não são definidos pela Base Curricular. As redes de ensino devem oferecer itinerários formativos que poderão focar em uma das áreas do conhecimento, como Linguagens, Matemática, Ciências da Natureza e Ciências Humanas, ou na formação profissional, e serão escolhidos pelo aluno. Nesse caso, o MEC também deve orientar as redes na construção desses percursos formativos.
– No caso do ensino médio, lembramos que os itinerários serão desenvolvidos pelas redes, pelos conselhos estaduais de educação e pelas escolas. O ministério está se dedicando à elaboração de um guia de orientação para implementação e implantação dos itinerários formativos que não constam da Base para que as redes de ensino tenham maiores oportunidades e algum apoio do MEC em relação a esse tema, que é novo e vai exigir de todos nós uma certa criatividade, muita imaginação e principalmente disrupção- explicou Maria Helena Guimarães.
Após a homologação do texto pelo MEC e a publicação, as mudanças estabelecidas pela reforma do ensino médio devem ser implementadas em até dois anos. Na esteira da BNCC, as avaliações, como o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), e os livros didáticos adotados pelo MEC também devem mudar.