Em dia marcado por confrontos, deputados dão aval a medidas exigidas pela UE e pelo FMI, como a redução de 22% no salário mínimo
ANDREI NETTO
Mesmo sob a pressão de até 80 mil manifestantes em Atenas, o Parlamento da Grécia aprovou na noite de ontem o quinto plano de austeridade desde setembro de 2009. O corte, de € 325 milhões, prevê a redução do salário mínimo em 22% e a aceleração das privatizações, exigências da União Europeia e do Fundo Monetário Internacional (FMI) para liberar o novo pacote de socorro de € 130 bilhões. O próximo desafio é sacramentar o acordo para o corte da dívida privada.
A sessão legislativa que analisaria o novo plano de rigor foi aberta no fim da tarde de ontem e se prolongou por boa parte da noite. Do lado de fora, cerca de 25 mil pessoas, segundo dados da polícia, e 80 mil, de acordo com as centrais sindicais, se reuniram na Praça Syntagma, a principal da capital, para protestar contra as medidas.
Após dois dias de greve geral, nos quais os transportes públicos e parte do comércio foram paralisados, os manifestantes voltaram a entrar em confronto com as tropas de choque, com pedras e coquetéis molotov de um lado e golpes de cassetete e bombas de gás lacrimogêneo, de outro. Vários prédios, alguns históricos, foram incendiados por manifestantes mascarados.
Comentando a rebelião em Atenas, o primeiro-ministro, Lucas Papademos, assegurou que a aprovação do pacote era a “única solução realista” para o impasse. “Os atos de violência e a destruição não têm lugar numa democracia”, disse Papademos.
No Parlamento, a pressão da opinião pública se refletiu na atmosfera tensa, mas a maioria dos deputados mais uma vez deu resposta positiva ao ultimato dos técnicos da troica, grupo formado pela UE, pelo Banco Central Europeu (BCE) e pelo FMI.
A aprovação era esperada porque o governo tinha maioria na Casa: cerca de 236 votos, entre 300. Porém, houve dissidências: 23 socialistas e 21 integrantes do Nova Democracia votaram contra os cortes e foram expulsos de seus partidos. O pacote foi aprovado com 199 votos a favor, 74 contra e 27 abstenções.
A principal medida, o rebaixamento do salário mínimo – que passa a € 586 (R$ 1.330) – chega a significar um corte de 32% para jovens com menos de 25 anos. O objetivo é combater o desemprego, hoje em 20%, e recuperar a competitividade do país por meio da redução do custo do trabalho em 15% até 2015.
Os deputados aprovaram ainda a aceleração do programa de privatizações, que deverá arrecadar neste primeiro semestre € 4,5 bilhões com a venda de estatais de fornecimento de gás e água, exploração de petróleo e de jogos de azar. A venda é uma das maiores exigências da UE e do FMI, que reclamam do atraso do programa. Em 2011, os leilões deveriam arrecadar € 5 bilhões, mas se limitaram a € 1,3 bilhão.
Às medidas se somam a redução de € 300 milhões do orçamento do Ministério da Defesa, a extinção de 500 prefeituras e a contratação de inspetores fiscais para combater a evasão de impostos. Os novos cortes são o quinto plano de austeridade do país, e juntos somam € 169 bilhões. Na negociação com os deputados, o ministro de Finanças, Evangelos Venizelos, chegou a dizer que, se a lei não fosse adotada, “o país iria à bancarrota”.
Credores. Com o novo plano, o governo de Lucas Papademos, chefe do Partido Socialista (Pasok), ganha sobrevida até as eleições legislativas previstas para o fim deste semestre. Com os recursos da UE e do FMI, a Grécia deve honrar o reembolso dos títulos da dívida soberana com vencimento em março, cujo total chega a € 14,5 bilhões.
Depois de mais uma semana de alta tensão política, o governo grego agora volta as atenções ao acordo com os credores privados para o corte de cerca de € 100 bilhões em dívidas, que vem sendo negociado há várias semanas. Segundo Venizelos, o documento deve ser submetido ao Parlamento até 17 de fevereiro – com dez dias de atraso em relação às últimas previsões.
Atenas espera que a aprovação permita ao fórum de ministros da zona do euro (Eurogrupo) determinar a liberação de novos recursos. “Queremos que a Grécia receba o sinal verde até a próxima reunião”, disse Venizelos. “Se (a aprovação) não ocorrer até 17 de fevereiro, não poderemos lançar oficialmente a operação de troca de títulos.”De acordo com o ministro, esse mesmo prazo é o limite
para a liberação dos recursos da UE e do FMI. Caso contrário, o reembolso das dívidas que vencem em 14 e 20 de março pode atrasar, levando o país à ameaça de moratória. “Se não acontecer, o país entrará em falência. E isso significará um país sem sistema bancário”, advertiu.