Texto segue à sanção presidencial
O Senado aprovou por unanimidade o marco civil da internet (PLC 21/14) aprovado pela Câmara dos Deputados em março último. Embora a oposição tenha firmado a necessidade de mais tempo para discussão sobre o tema, uma manobra regimental do governo possibilitou a inversão de pauta e colocou o projeto como primeiro item da Ordem do Dia desta terça-feira (22).
O interesse da base foi a aprovação rápida e sem emendas para que o projeto vire lei durante o seminário Netmundial, que ocorrerá em São Paulo a partir desta quarta-feira (23).
O projeto será encaminhado agora para sanção da presidente da República, Dilma Rousseff. Ele estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para internautas e provedores na rede mundial de computadores no Brasil.
Mais cedo, o líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM), garantiu que haverá oportunidade de ajustes do texto no futuro, por meio de medida provisória. De manhã, duas comissões permanentes haviam aprovado o projeto – a de Constituição e Justiça e a de Ciência e Tecnologia. A terceira comissão de mérito pela qual o projeto deveria passar foi a Comissão de Fiscalização e Controle, que deu seu parecer já no Plenário.
Participação popular
O relator, senador Ricardo Ferraço (PMDB-ES), destacou que o projeto é fruto de um amplo ciclo de debates e consultas feitos, inclusive, pela rede de computadores. De acordo com ele, o marco civil foi construído pelos usuários por um processo inovador, inclusivo e democrático. “O resultado foi um texto maduro, equilibrado e inteligente, que balanceia os direitos e obrigações dos usuários”, disse Ferraço.
Ele lembrou que hoje os administradores de sites de hospedagem podem retirar conteúdos mediante notificações. A partir da nova lei, isso terá de ser feito apenas por determinação judicial.
Na opinião do senador, o Brasil está dificultando a ação de hackers e serviços de espionagem de dados e comunicações. “Essa é uma norma legal para coibir a cooperação das empresas de internet com agências e serviços de espionagem eletrônica, como a norte-americana NSA. A evolução tecnológica tornou difícil, senão impossível, a plena garantia da privacidade online. Mas o sigilo das comunicações pela internet estará certamente mais protegido com as novas regras para guarda e disponibilização de dados pessoais.”
Ferraço concordou que o texto merecia mais análise, mas disse que está satisfeito com a promessa feita por Braga de que ele poderá ser revisado mais tarde.
O senador Walter Pinheiro (PT-BA) também considerou a hipótese, “Este é um conjunto de diretrizes que aponta para o ordenamento do uso da internet. Aperfeiçoamentos podem ocorrer, futuramente.”
No debate, Pinheiro lembrou que a sobrevivência tem sido difícil para os pequenos provedores de internet. Os que dominam o mercado, afirmou, estão ligados a grandes empresas de telecomunicações. “A neutralidade determina o caminho e a qualidade do serviço prestado, tendo em vista o direito do cidadão. O marco civil permite completar a obra de liberdade de comunicação e a quebra de monopólios que tínhamos no País”, explicou.
Críticas
O senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) disse que a oposição poderia impedir a votação obstruindo-a ou apresentando emendas de Plenário, mas não o faria. Contudo, lamentou a posição da presidente Dilma e o “afã dos senadores em querer agradá-la”. Como os demais senadores da oposição, ele pedia tempo para aperfeiçoar o texto.
O artigo 31 foi um dos que estava na mira de Aloysio. O texto determina que “até a entrada em vigor de lei específica, a responsabilidade do provedor de aplicações de internet por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros, quando se tratar de infração a direitos de autor ou a direitos conexos, continuará a ser disciplinada pela legislação autoral vigente”. Aloysio traduziu o enunciado como se dissesse “a lei de direitos autorais deve ser respeitada até quando for modificada”. “Isso é ridículo”, resumiu o parlamentar.
A oposição focou, ainda, a redação do artigo 10, que trata da guarda e da disponibilização dos registros de conexão e de acesso a aplicações de internet, como de dados pessoais e do conteúdo de comunicações privadas. O texto motivou dúvidas durante a votação na Comissão de Constituição e Justiça porque havia preocupação sobre a abrangência do termo “autoridades administrativas”, que podem requisitar dados cadastrais, por exemplo.
O relator do projeto na comissão, senador Vital do Rêgo (PMDB-PB), concordou com a troca de “autoridades administrativas” por “delegado de polícia e o Ministério Público”, mas ela não foi adiante porque faria o projeto voltar para a Câmara, e isso não era interesse do governo.
Neutralidade da rede
Entre os principais pontos do projeto, está o artigo 9º, que protege a neutralidade de rede. Ou seja, o tratamento isonômico de quaisquer pacotes de dados, sem distinção de preços para a oferta de conteúdo. A regra determina tratamento igual para todos os conteúdos que trafegam na internet.
Assim, os provedores ficam proibidos de discriminar usuários conforme os serviços ou conteúdos que eles acessam – cobrando mais, por exemplo, de quem acessa vídeos ou aplicações de compartilhamento de arquivos (que exigem maior utilização de banda larga).
Tramitação
Encaminhado pela Presidência da República em 2011, o marco civil foi aprovado na Câmara dos Deputados no final de março deste ano, depois de estar em pauta por dois anos. No Senado, o texto já chegou com pedido de urgência constitucional, ou seja, com prazo de 45 dias para análise. Não levou nem um mês para ser votado.
A proposta começou a ser discutida em 2009 e foi elaborada pelo governo tendo como base o documento “Princípios para a governança e o uso da internet”, do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br). O texto, que passou por consulta pública entre 2009 e 2010, busca estabelecer uma regulamentação geral sobre o uso da internet.
Marco Civil
Princípios:
– Garantia da liberdade de expressão
– Proteção da privacidade e dos dados pessoais
– Neutralidade da rede
– Liberdade dos modelos de negócios
Direitos:
– Controle sobre os dados pessoais
– Inviolabilidade e sigilo das comunicações
– Manutenção da qualidade contratada da conexão
– Exclusão definitiva de dados pessoais após término de contratos
– Informações claras e completas nos contratos
Obrigações:
– Provedores de conexão
Guardar, sob sigilo, os dados de conexão dos usuários (endereço, IP, dado e hora do início e término da conexão( pelo prazo de um ano
– Provedores de aplicativos
Guardar, sob sigilo, os dados de navegação dos usuários pelo prazo de seis meses
– Retirar, a pedido das vítimas, imagens e vídeos contendo cenas de nudez ou sexo que não têm a autorização dos envolvidos
Segurança:
– Os provedores, mesmo que sediados no exterior, deverão respeitar a legislação brasileira, incluindo os direitos a privacidade e ao sigilo dos dados
Íntegra da proposta: PL-2126/2011
Da Redação – RCA
Com informações da Agência Senado