Tancredo Neves, a CUT e o PT


Almir Pazzianotto Pinto

No dia 21 de abril completam-se 25 anos da morte do presidente Tancredo Neves. Após longo sofrimento, o dr. Tancredo sucumbiu à doença que o perseguira ao longo da campanha presidencial e na viagem ao exterior, depois da vitória no Colégio Eleitoral, em 5 de janeiro de 1985, reunido na forma do artigo 74 da Constituição de 1967. O dr. Tancredo obteve 480 votos; Paulo Maluf, 180; registrando-se 17 abstenções, 5 do PT, e 9 ausências.

Em 14 de março, à noite, preparando-se para a posse, o dr. Tancredo Neves, que comemorara 75 anos no dia 4, participou da missa no Santuário Dom Bosco, oficiada por Dom João de Rezende Costa, arcebispo de Belo Horizonte.

Momentos depois, vítima de fortes dores, o dr. Tancredo foi levado ao Hospital de Base para ser operado de complicações no divertículo. Desde esse instante a população brasileira passou a aguardar o restabelecimento do seu líder, expectativa que, desgraçadamente, não se concretizou.

Exemplo do estilo mineiro de fazer política, o dr. Tancredo sabia como ninguém combinar energia, coragem e firmeza nos momentos críticos, como por ocasião do suicídio do presidente Getúlio Vargas em 24 de agosto de 1954, com a lhaneza, paciência e diplomacia que lhe permitiram encaminhar, em nome da oposição, a sucessão do presidente João Figueiredo e obter dos comandantes militares o compromisso de que respeitariam os resultados da eleição indireta.

Raras vezes estive com o dr. Tancredo. À época, era secretário do Trabalho do governo Franco Montoro.

O primeiro encontro ocorreu no Palácio das Mangabeiras, sede do governo de Minas Gerais, em almoço do qual participaram líderes do PMDB. Em determinado momento, o governador me pediu informações sobre a estrutura sindical. Disse-lhe o que pensava, destaquei o problema do peleguismo e declarei que a solução consistia na ratificação da Convenção 87 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata da autonomia de organização e garante liberdade de sindicalização.

Com o dr. Tancredo eleito, soube pelo dr. Roberto Gusmão, secretário de Governo, de reunião com o dr. Francisco Dornelles, futuro ministro da Fazenda. O encontro se deu em São Paulo, ocasião na qual fui informado de que assumiria o Ministério do Trabalho, cabendo ao dr. Gusmão o Ministério da Indústria e Comércio.

Nos últimos dias de fevereiro compareci à Granja do Torto, onde o dr. Tancredo disse-me que era convocado para “sofrer com ele durante quatro anos”.

O decreto designando-me ministro acha-se assinado pelo dr. Tancredo na qualidade de presidente da República e é datado de 15 de março de 1985. Quem me entregou a cópia foi o ministro-chefe da Casa Civil, José Hugo Castelo Branco, acompanhada de mensagem pessoal. O documento de posse contém o autógrafo do vice-presidente José Sarney.

Antes mesmo da nomeação, fora incumbido da tarefa de negociar entendimento entre governo, patrões e trabalhadores.

O dr. Tancredo julgava indispensável, para a recuperação econômica e o sucesso do período de transição, que se fizesse algo semelhante aos pactos celebrados na Espanha após a morte de Francisco Franco, em 1975, com a instituição do regime monárquico democrático.

Seis importantes acordos, o primeiro conhecido como Pacto de Moncloa, haviam sido firmados, entre 1977 e 1984, pelo ministro Adolfo Suarez com a Confederação Espanhola de Organizações Empresariais (CEOE) e a União Geral dos Trabalhadores (UGT), para tornar possível, em clima de tranquilidade sindical, a estabilidade da moeda, a retomada do desenvolvimento e a criação de empregos.

A revista Senhor de 9 de janeiro de 1985 publica entrevista do dr. Tancredo Neves a Mino Carta, em que ele revela desejar “uma trégua para organizar o pacto social que poderá remeter o País a um novo patamar de crescimento”.

As reações ao pacto foram divergentes. Enquanto Joaquim dos Santos Andrade, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo e da Conclat, reconhecia a gravidade da crise e se revelava disposto a colaborar, a associação CUT-PT abria hostilidades contra o dr. Tancredo, sem mesmo tentar saber o que se pretendia.

Em vez de aceitar o diálogo, um desvairado Jair Meneguelli panfletava fábricas com a seguinte mensagem: “Metalúrgicos vão à greve contra o pacto.”

O Jornal da Tarde, na edição de 11 de fevereiro, estampava as manchetes: “A CUT e o PT declaram guerra a Tancredo” e “Os trabalhadores metalúrgicos do ABC vão à luta já, contra o pacto.”

Os fatos revelariam que PT e CUT não blefavam. Em abril a CUT ocupou as instalações da GM, em São José dos Campos, e submeteu a cárcere privado 370 funcionários, vítimas de violências e humilhações.

Na manifestação de 1.º de maio, realizada na Praça da Sé, Meneguelli esbravejava: “Vamos parar o Brasil de norte a sul.” De fato, o Brasil via-se atacado por milhares de greves políticas e selvagens.

Em 24 de junho de 1985, o presidente José Sarney convidou as lideranças sindicais, sem exceção, para reunião na Granja do Torto, a fim de discutir como deter a inflação, retomar o crescimento e aumentar salários. Compareceram todos, à exceção da CUT, empenhada no boicote do governo.

Jamais saberemos como seria o Brasil se o dr. Tancredo houvesse governado. A História, porém, é implacável e registra que o PT e a CUT foram responsáveis por 20 anos de atraso, até que o País recuperasse a estabilidade e o desenvolvimento, graças ao Plano Real.

ADVOGADO, FOI MINISTRO DO TRABALHO (1985-1988) E MINISTRO DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (1988-2002)