“Um conhecido ditado popular afirma que a dose do remédio pode ser a diferença entre salvar ou matar o paciente. A Petrobras, uma das maiores empresas brasileiras, envolvida em uma teia de desmandos e corrupção, está na UTI.
A Operação Lava Jato, que vem trazendo à tona toda sorte de corrupção e negociatas, está deixando os brasileiros receosos. Quem tem o dever de acusar e decidir se cabe pena às empresas envolvidas está diante de um desafio único, calcado em um duplo alicerce: restabelecer a confiança da sociedade na instituição e conduzir uma profilaxia do setor na dose certa.
Nunca antes em nossa história houve tanta responsabilidade nas mãos de autoridades públicas.
Estamos preocupados com o futuro de milhões de trabalhadores. Operários dos mais diversos setores –especialmente da construção civil e da construção pesada– estão sendo vitimados pela reação em cadeia criada pelo processo. Dados garimpados pelo consultor em infraestrutura Maurício Portugal revelam que 5% da população brasileira está vinculada direta ou indiretamente à atividade desses grupos econômicos.
A Força Sindical tem 72 entidades desses setores, com cerca de 1 milhão de trabalhadores. Contabilizamos cerca de 30 mil operários demitidos sem receber seus direitos porque as empregadoras também não estão recebendo da Petrobras. Esse círculo vicioso resulta em mais demissões e trabalhadores de bolsos vazios e com documentos retidos por falta de rescisão, sem poder tocar suas vidas adiante.
O Ministério Público entrou com ações de improbidade na Justiça pedindo que as empreiteiras sejam proibidas de trabalhar para qualquer órgão público. Julgamos correto punir as empresas, mas impedi-las de seguir atuando devido aos desmandos de funcionários é, no mínimo, uma arbitrariedade que só traz prejuízos à sociedade.
Ao tornar as empresas nacionais inidôneas abrimos mercado para a concorrência estrangeira atuar em áreas estratégicas para o país. Caso prevaleça a ideia de que a melhor forma de se curar dor de cabeça é cortando-a fora, estaremos jogando nossos empregos e tecnologia no lixo e estrangulando o desenvolvimento das nossas indústrias.
Se nossas empresas se tornarem inidôneas, esse risco pode contaminar toda a economia, fazendo dos problemas uma calamidade.
É a partir da tecnologia que o país se torna independente economicamente e as empresas, mais sólidas e competitivas. O processo contrário gera empresas “ocas”, responsáveis apenas por montar e distribuir tecnologia estrangeira, sem qualquer retorno para o país, que se torna mais vulnerável a intempéries conjunturais.
Nossa expectativa é que haja providências imediatas dos órgãos competentes para atenuar e reverter os prejuízos da Lava Jato, que penalizam a classe trabalhadora.
É possível afirmar, como já se disse, que a Lava Jato, ao completar um ano neste mês, representa para nós o que a Operação Mãos Limpas significou para o povo italiano: o enfrentamento qualificado de uma organização criminosa infiltrada nas estruturas do Estado.
Por isso, conclamamos que o juiz federal Sergio Moro continue firme, sabendo que toda a sociedade espera que os resultados vislumbrem novos horizontes e rupturas.
Alinha-se ao desafio de punir culpados sem matar as empresas um outro, tão ou mais importante: o Estado agir para conter os efeitos colaterais do remédio aplicado no organismo moribundo. Só não é justo trucidar o setor de infraestrutura, impedindo-o de atuar, gerar empregos e tecnologia”.
Miguel Torres, 56, é presidente da Força Sindical