Governo agiliza corte de benefício sob suspeita de idoso e deficiente pobre

Pagamento em caso suspeito de irregularidade poderá ser bloqueado mesmo se INSS não notificar beneficiário

Ranier Bragon
Laís Alegretti

Sob o argumento de melhorar o gasto público, o presidente Michel
Temer vai acelerar o corte do pagamento de benefício de um salário mínimo
a idosos e pessoas com deficiência em situação de miséria em que haja
suspeita de irregularidade.

O governo preparou um decreto que não só agiliza a suspensão do
pagamento do BPC (Benefício de Prestação Continuada) em casos suspeitos como cria novas situações em que o pagamento pode ser cortado.

Conhecido por muitos beneficiários simplesmente como aposentadoria, o
BPC é uma assistência de um salário mínimo mensal paga a pessoas com
deficiência ou com mais de 65 anos que tenham renda familiar per capita de
até 25% do salário mínimo (R$ 954), que comprovem condição de
miserabilidade.

Hoje, isso significa menos de R$ 238,50 por pessoa. O benefício não dá
direito a pensão nem paga 13º.

O benefício assistencial, que hoje sustenta 4,6 milhões de pessoas, tem
orçamento anual de mais de R$ 50 bilhões —maior do que o do Bolsa Família
(R$ 29 bilhões em 2017).

O texto do decreto, ao qual a Folha teve acesso, determina que o valor do
benefício será bloqueado mesmo que o INSS, responsável pelo pagamento do
BPC, não consiga notificar o beneficiário.

Só após o bloqueio, se entrar em contato com o INSS, o beneficiário
entenderá o motivo pelo qual teve o benefício cortado. Além disso, terá
apenas dez dias para para apresentar a defesa.

A previsão é que o decreto seja publicado no Diário Oficial desta quinta-feira
(9).

De acordo com a regra hoje em vigor, se o governo não consegue notificar o
beneficiário por correio, é necessária uma notificação por meio de edital e há
prazo de 15 dias para apresentação de defesa.

Se o texto anterior dizia apenas que o BPC seria suspenso quando fosse
identificada irregularidade na sua concessão, o novo decreto traz mais
previsões.

Entre elas, a “identificação de inconsistências ou insuficiências cadastrais
que afetem a avaliação de elegibilidade do beneficiário” e o “não
agendamento da reavaliação da deficiência até a data-limite estabelecida em
convocação”.

O governo Temer já havia tentado mexer no BPC quando enviou proposta de
reforma da Previdência ao Congresso. O texto original aumentava a idade
mínima, hoje em 65 anos, para 70 e desvinculava o valor do benefício do
salário mínimo.

A Folha revelou que o governo gastou no ano passado R$ 5,5 bilhões em
benefícios pagos a pessoas que, segundo ele, estão fora das regras do benefício.

O valor pago de forma indevida em um ano é maior do que os R$ 4,5 bilhões
que foram gastos com todos os mais de 4 milhões de beneficiários do BPC no
mês de junho.

Um problema antigo da política do BPC é a judicialização.

Em decisão de 2013, o Supremo considerou inconstitucional o critério de um
quarto do salário mínimo. Na ocasião, os ministros consideraram que a regra
estava defasada para caracterizar a situação de miserabilidade.

Até hoje, contudo, a lei não foi alterada para estabelecer um novo patamar
para acessar o benefício.